William James, sobre a Consciência como sendo uma função, e não uma entidade.
Universidade de Havard
“Pensamentos” e “coisas” são nomes para dois tipos de objetos, os quais o senso comum sempre encontrará contrastados e sempre se oporão um ao outro na prática. A filosofia, refletindo sobre esse contraste, variou no passado quanto às explanações sobre o assunto, e pode ser esperada uma variação no futuro. A princípio, “espírito e matéria”, “alma e corpo”, significava um par de substâncias equipolentes bastante parciais em importância e em interesse. Mas um dia Kant solapou a alma e trouxe o ego transcendental, e desde então a relação bipolar tem constituído uma grande parte de seu equilíbrio. O ego transcendental hoje em dia parece estar nos círculos racionalistas servindo de suporte para tudo, e nos círculos empíricos servido para quase nada. Nas mãos de escritores como Schuppe, Rehmke, Natorp, Miinsterberg — e, de qualquer forma em seus escritos anteriores, Schubert-Soldern e outros —, o princípio espiritual se atenua a uma condição totalmente fantasmagórica, sendo apenas um nome devido ao fato de que o “conteúdo” da experiência é conhecido. Ele perde a forma e a atividade pessoal — estes passam para o conteúdo — e torna-se um Bewusstheit ou Bewusstsein iberhaupt puro e simples, do qual, por direito próprio, nada pode ser dito.
Acredito que a ‘consciência’, uma vez que tenha se evaporado para esse estado de pura diafaneidade, está a ponto de desaparecer por completo. Esse é o nome de uma não-entidade e não tem direito a um lugar entre os primeiros princípios. Aqueles que ainda se agarram a isso, agarram-se a um mero eco, ao rumor tênue deixado para trás pela “alma” desaparecida no ar da filosofia. Durante o ano passado, li uma série de artigos cujos autores pareciam estar a ponto de abandonar a noção de consciência1 e de substituí-la por uma experiência absoluta e que não é devida a dois fatores. Mas eles não eram suficientemente radicais, nem ousados o suficiente em suas negações. Há vinte anos eu desconfiava da “consciência” como entidade; há sete ou oito anos eu sugeria sua não existência a meus alunos, e tentava dar-lhes seu equivalente pragmático na realidade da experiência. Parece-me que a hora está madura para ela ser abertamente e universalmente descartada.
Negar a existência da “consciência” parece tão absurdo — porque inegavelmente existem “pensamentos” — que temo que alguns leitores não me sigam mais adiante. Deixe-me então explicar imediatamente que quero apenas negar que a palavra represente uma entidade, mas insistir muito enfaticamente que ela representa uma função. Não há, quero dizer, nenhum material aborígine ou qualidade de ser, em contraste com aquele de que os objetos materiais são feitos, a partir do qual nossos pensamentos sobre eles se fazem; mas há uma função na experiência que os pensamentos desempenham, e para o desempenho da qual essa qualidade de ser é invocada. Essa função é o conhecimento. A “consciência” é suposta ser necessária para explicar o fato de que as coisas não só são, como também são relatadas, são conhecidas. Quem quer que exclua a noção de consciência de sua lista de primeiros princípios deve ainda prover de algum modo para que essa função seja desempenhada.
I
Minha tese é a de que, se começarmos com a suposição de que existe apenas uma coisa ou um material primário no mundo, um material do qual tudo é composto, e se chamarmos esse material de ‘experiência pura’, então o conhecimento pode ser facilmente explicado como sendo um tipo particular de relação de uns com outros em que partes da experiência pura podem ingressar. A própria relação é uma parte da experiência pura; um de seus ‘termos’ torna-se o sujeito ou portador do conhecimento, o conhecedor2, o outro torna-se o objeto conhecido. Isso precisará de muita explicação para que possa ser compreendido. A melhor maneira de entendê-lo é contrastá-lo com a visão alternativa; e, para isso, podemos tomar a alternativa mais recente, aquela em que a evaporação definitiva da alma-substância tenha procedido até onde possa ir sem estar ainda completa. Se o neo-Kantismo expulsou formas anteriores de dualismo, teremos expulsado todas as formas se, por nossa vez, formos capazes de expulsar o neo-Kantismo.
Para os pensadores que eu chamo de neo-Kantianos, a palavra consciência hoje não faz mais do que sinalizar o fato de que a experiência é indefectivelmente dualista na estrutura. Isso significa que nem sujeito, nem objeto, mas objeto-mais-sujeito é o mínimo que pode realmente ser. A distinção sujeito-objeto, entretanto, é totalmente diferente da distinção entre mente e matéria, e da distinção entre corpo e alma. As almas eram destacáveis, tinham destinos separados; coisas poderiam acontecer com elas. À consciência enquanto tal, nada pode acontecer, porque, atemporal por si mesma, ela é apenas uma testemunha dos acontecimentos no tempo, nos quais não desempenha nenhum papel. Em uma palavra, ela é porém a correlação lógica do “conteúdo” em uma Experiência cuja peculiaridade é que nela surge o fato, que a constatação do conteúdo se dá. A consciência enquanto tal é totalmente impessoal — “self” — e suas atividades pertencem ao conteúdo. Dizer que estou consciente de mim mesmo, ou consciente de apresentar volição, significa apenas que certos conteúdos, para os quais o “eu” e o “esforço da vontade” são os nomes, não estão sem testemunha, pois eles ocorrem.
Assim, para esses recém-chegados à primavera kantiana, deveríamos admitir a consciência como uma necessidade “epistemológica”, mesmo que não tivéssemos nenhuma evidência direta de sua existência.
Contudo, além disso, é suposto que quase todos nós tenhamos uma consciência imediata da própria consciência. Quando o mundo do fato exterior deixa de estar materialmente presente, e nos limitamos a relembrá-lo em memória, ou a imaginar, acredita-se que a consciência se destaca e é sentida como uma espécie de fluxo interno impalpável, que, uma vez conhecido nesse tipo de experiência, pode igualmente ser detectado em representações do mundo exterior. “O momento em que tentamos fixar nossa atenção na consciência e ver o que, distintamente, ela é”, diz um escritor recente, “ela parece desaparecer”. Parece-nos que temos diante de nós um mero vazio. Quando tentamos introspectar a sensação de azul, tudo o que podemos ver é o azul; o outro elemento é como se fosse diáfano. No entanto, ele pode ser distinguido, se olharmos com atenção suficiente, e soubermos que há algo a procurar”3. “A consciência” (Bewusstheit), diz outro filósofo, “é inexplicável e dificilmente descritível, mas todas as experiências conscientes têm em comum o fato de que o que chamamos de seu conteúdo tem esta peculiar referência a um centro para o qual “self” é o nome, em virtude do qual somente a referência ao conteúdo é dada subjetivamente, ou aparece… Enquanto que dessa forma a consciência, ou referência a um eu, é a única coisa que distingue um conteúdo consciente de qualquer tipo de ser que possa estar ali sem que haja ninguém consciente dele, ainda assim esse único fundamento da distinção desafia todas as explicações mais próximas. A existência da consciência, embora seja o fato fundamental da psicologia, pode, de fato, ser estabelecida como certa, pode ser evidenciada pela análise, mas não pode ser definida nem deduzida de nada além de si mesma “4.
“Pode ser evidenciada pela análise”, diz esse autor. Isso supõe que a consciência é um elemento, um momento, um fator — chame-a como quiser — de uma experiência de constituição interior essencialmente dualista, da qual, se você abstrair o conteúdo, a consciência permanecerá revelada a seus próprios olhos. A experiência, nesse ritmo, seria muito parecida com uma pintura a partir da qual são feitos os retratos do mundo. A tinta tem uma constituição dual, envolvendo, por assim dizer, um menstruum5 (óleo, size ou qualquer outro) e uma massa de conteúdo sob a forma de pigmento suspenso nele. Podemos obter o menstruum puro deixando o pigmento assentar, e obter o pigmento puro despejando o size ou óleo. Operamos aqui por subtração física; e a visão usual é que por subtração mental podemos separar os dois fatores de experiência de maneira análoga — não isolando-os completamente, mas distinguindo-os o suficiente para saber que são dois.
II
Ora, minha opinião é exatamente o oposto disso. A experiência, acredito, não tem tal duplicidade interior; e a separação dela em consciência e conteúdo surge não por meio de subtração, mas por meio de adição — a adição, a uma determinada peça concreta dela, de outros conjuntos de experiências, em conexão com as quais várias vezes seu uso ou função pode ser de dois tipos diferentes. A tinta também servirá aqui como uma ilustração. Em um pote na oficina de pintura, junta com outras tintas, ela serve em sua totalidade como matéria totalmente comerciável. Espalhada sobre uma tela, com outras tintas ao seu redor, ela representa, ao contrário, uma característica em um quadro e desempenha uma função espiritual. Só assim, afirmo, uma determinada porção indivisa da experiência, assumida em um contexto de associados, desempenha o papel de um conhecedor, de um estado de espírito, de ‘consciência’; enquanto em um contexto diferente o mesmo pedaço indiviso de experiência desempenha o papel de uma coisa conhecida, de um ‘conteúdo’ objetivo. Resumindo, em um grupo ela figura como um pensamento, em outro grupo como uma coisa. E, como pode figurar em ambos os grupos simultaneamente, temos todo o direito de falar dela como subjetiva e objetiva ao mesmo tempo. O dualismo conotado por termos como “experiência”, “fenômeno”, “datum“, “Vorfindung” — termos que, em filosofia, de qualquer forma, tendem cada vez mais a substituir os termos “pensamento” e “coisa” —, esse dualismo, eu digo, ainda é preservado neste relato, mas reinterpretado, de modo que, em vez de ser misterioso e elusivo, ele se torna verificável e concreto. Ele é um caso de relações, cai fora, não dentro, da única experiência considerada, e pode sempre ser particularizado e definido.
A cunha de entrada para essa maneira mais concreta de entender o dualismo foi moldada por Locke quando ele fez com que a palavra “idéia” ficasse indiferente às coisas e ao pensamento, e por Berkeley quando disse que o que o senso comum significa por realidades é exatamente o que o filósofo significa por idéias. Nem Locke nem Berkeley pensaram sua verdade com perfeita clareza, mas parece-me que a concepção que estou defendendo pouco mais faz do que realizar consistentemente o método “pragmático” que eles foram os primeiros a usar.
Se o leitor fizer suas próprias experiências, perceberá o que quero dizer. Que ele comece com uma experiência perceptiva, a ‘apresentação’, assim chamada, de um objeto físico, de seu campo de visão real, da sala em que ele se senta, com o livro que ele está lendo como seu centro; e que ele trate esse objeto complexo da maneira do senso comum, como sendo ‘realmente’ o que ele parece ser, ou seja, uma coleção de coisas físicas recortadas de um mundo ambiental de outras coisas físicas com as quais essas coisas físicas têm relações reais ou potenciais. Ora, ao mesmo tempo, são apenas essas mesmas coisas que sua mente, como dizemos, percebe; e toda a filosofia da percepção, do tempo de Demócrito para baixo, tem sido apenas uma longa disputa sobre o paradoxo de que o que é evidentemente uma realidade deve estar em dois lugares ao mesmo tempo, tanto no espaço exterior quanto na mente de uma pessoa. Teorias ‘representativas’ de percepção evitam o paradoxo lógico, mas por outro lado violam o sentido de vida do leitor, que não conhece nenhuma imagem mental interveniente, mas parece ver a sala e o livro imediatamente tal como eles existem fisicamente.
O enigma de como uma sala idêntica pode estar em dois lugares é no fundo apenas o enigma de como um ponto idêntico pode estar em duas linhas. Ele pode, se estiver situado em sua intersecção; e, do mesmo modo, se a “experiência pura” da sala fosse um lugar de intersecção de dois processos, que a conectassem com diferentes grupos de associados respectivamente, poderia ser contada duas vezes, como pertencendo a qualquer um dos grupos, e falada de modo amplo como existente em dois lugares, embora permanecesse o tempo todo uma coisa numericamente única.
Pois bem, a experiência é um membro de diversos processos que podem ser seguidos fora dela ao longo de linhas totalmente diferentes. A coisa única e auto-idêntica tem tantas relações com o resto da experiência que você pode considerá-la em diferentes sistemas de associação, e tratá-la como pertencendo a contextos opostos. Em um desses contextos ela é seu ‘campo de consciência’; em outro, é ‘a sala em que você se senta’, e entra em ambos os contextos em sua totalidade, não dando nenhum pretexto para ser dito que se apega à consciência por uma de suas partes ou aspectos, e à realidade externa por outra. Quais são os dois processos, agora, em que a sala-experiência entra simultaneamente desse modo?
Um deles é a biografia pessoal do leitor, o outro é a história da casa da qual a sala faz parte. A apresentação, a experiência, aquilo que em suma (pois até decidirmos o que é, deve ser um mero aquilo) é o último termo de um conjunto de sensações, emoções, decisões, movimentos, classificações, expectativas, etc., terminando no presente, e o primeiro termo de uma série de operações ‘internas’ semelhantes que se estendem para o futuro, por parte do leitor. Por outro lado, o mesmo aquilo é o terminus ad quem de muitas operações físicas anteriores, da carpintaria, da papelaria, mobiliário, calefação, etc., e o terminus a quo de muitas operações futuras, com as quais se preocupará ao se submeter ao destino de uma sala física. As operações físicas e mentais formam grupos curiosamente incompatíveis. Como sala, a experiência tem ocupado esse lugar e tido esse ambiente por trinta anos. Como seu campo de consciência, ela pode nunca ter existido até agora. Como uma sala, a atenção continuará a descobrir infinitos novos detalhes nela. Como simplesmente seu estado mental, poucos novos surgirão sob o olhar da atenção. Como uma sala, será necessário um terremoto, ou um bando de homens, — e em qualquer caso, uma certa quantidade de tempo — para destruí-la. Como seu estado subjetivo, o fechamento de seus olhos, ou qualquer jogo instantâneo de sua fantasia será suficiente. No mundo real, o fogo irá consumi-la. Em sua mente, você pode deixar o fogo brincar sobre ela sem que haja efeito. Como objeto exterior, você deve pagar tanto por mês para habitá-la. Como conteúdo interno, você pode ocupá-la por qualquer período de tempo livre de aluguel. Se, em suma, você a segue na direção mental, levando-a junto apenas com eventos da biografia pessoal, todos os tipos de coisas a respeito dela são verdades que são falsas, e há as falsidades que são verdadeiras, se você a trata como uma coisa real experimentada, a segue na direção física, e a relaciona com os associados no mundo exterior.
III
Até agora, tudo parece simples, mas minha tese provavelmente tornar-se-á menos plausível para o leitor quando eu passar das percepções para os conceitos, ou do caso das coisas apresentadas para o das coisas remotas. Acredito, no entanto, que aqui também a mesma lei é válida. Se considerarmos as coleções conceituais, ou memórias, ou fantasias, elas também são, em sua primeira intenção, meros pedaços de experiência pura, e, como tal, são um simples aquilo que atua em um contexto como objetos, e em outro contexto figura como estados mentais. Por interpretá-las em sua primeira intenção, refiro-me a ignorar sua relação com possíveis experiências perceptivas com as quais podem estar conectadas, às quais podem levar a e terminar em, e que depois podem ser supostas como “representando”. Considerando-as dessa modo em primeiro lugar, limitamos o problema a um mundo meramente “pensado” e não sentido diretamente ou visto. Tal mundo, assim como o mundo dos perceptos, chega até nós no início como um caos de experiências, mas as linhas de ordem logo são traçadas. Descobrimos que qualquer pedaço dele que possamos destacar como exemplo está ligado a grupos distintos de associados, tal como o são nossas experiências perceptivas, que esses associados se ligam a ele por relações diferentes6, e que um forma a história interna de uma pessoa, enquanto o outro age como um mundo impessoal ‘objetivo’, seja espacial e temporal, ou meramente lógico ou matemático, ou de outra forma ‘ideal’.
O primeiro obstáculo por parte do leitor para ver que essas experiências não-perceptivas têm objetividade, bem como subjetividade, provavelmente será devido à intrusão em sua mente de percepções, aquele terceiro grupo de associados com os quais as experiências não-perceptivas têm relações, e as quais, como um todo, elas ‘representam’, situando-se em relação a elas tal como os pensamentos em relação as coisas. Essa importante função das experiências não-percepcionais complica a questão e a confunde; porque, assim utilizadas estamos tratando as percepções como sendo as únicas realidades genuínas e, a menos que as mantenhamos fora da discussão, tendemos a ignorar completamente a objetividade que reside nas experiências não-percepcionais por si só. Nós as tratamos, “conhecendo” as percepções como elas são, como por meio e através do subjetivo, e dizemos que elas são totalmente constituídas das coisas chamadas de consciência, usando esse termo agora para uma espécie de entidade, segundo a moda que eu estou procurando refutar7.
Abstraindo, então, da percepção total, o que afirmo é que qualquer simples experiência não-perceptiva tende a ser contada duas vezes, da mesma maneira que uma experiência perceptiva, figurando em um contexto como um objeto ou campo de objetos, em outro como um estado da mente: e tudo isso sem a menor auto-orientação interna de sua própria parte dentro da consciência e do conteúdo. É tudo consciência em um sentido; e, no outro, tudo conteúdo.
Eu encontrei essa objetividade das experiências não-percepcionais, esse completo paralelismo no ponto da realidade entre o presente sentido e o remotamente pensado, tão bem exposto em uma página do ‘Grundzige‘ de Miinsterberg, que vou citá-lo tal como está
“Posso pensar apenas nos meus objetos”, diz o professor Miinsterberg; “contudo, em meu pensamento vivo, eles estão diante de mim exatamente como objetos percebidos fariam, não importa quão diferentes as duas formas de apreendê-los possam ser em sua gênese. O livro aqui deitado sobre a mesa diante de mim, e o livro na sala vizinha no qual penso e que pretendo buscar, são ambos, no mesmo sentido, dadas realidades para mim, realidades que eu reconheço e as quais eu levo em conta. Se você concorda que o objeto perceptivo não é uma idéia dentro de mim, mas que a percepção e a coisa, tal como indistintamente uma, são realmente vivenciadas lá, fora, você não pode acreditar que o objeto meramente pensado está escondido dentro do sujeito pensante. O objeto sobre o qual eu penso, e de cuja existência eu tomo consciência sem deixá-lo agora funcionar sobre meus sentidos, ocupa seu lugar definitivo no mundo exterior tanto quanto o objeto que eu vejo diretamente”.
“O que é verdade do aqui e do ali, também é verdade do agora e o então. Sei do que está presente e percebido, mas sei também do que ontem foi mas não é mais, e do que só me lembro. Ambos podem determinar minha conduta atual, ambos são partes da realidade da qual eu guardo registro. É verdade que de grande parte do passado eu sou incerto, assim como sou incerto de grande parte do que está presente se ele não é percebido. Todavia, o intervalo de tempo não altera, em princípio, minha relação com o objeto, não o transforma de um objeto conhecido em um estado mental […] As coisas aqui na sala que pesquiso, e aquelas em minha casa à distancia nas quais penso, as coisas deste minuto e as de minha longa infância, me influenciam e me determinam da mesma maneira, com uma realidade que minha experiência delas sente diretamente. Ambas compõem meu mundo real, fazem-no diretamente, não precisam primeiro ser apresentadas a mim e mediadas por idéias que agora e aqui surgem dentro de mim […] Este caráter não-eu das minhas lembranças e expectativas não implica que os objetos externos dos quais estou ciente nessas experiências devam necessariamente estar lá também para os outros. Os objetos dos sonhadores e das pessoas alucinadas são totalmente sem validade geral. Mas mesmo se fossem centauros e montanhas douradas, eles ainda estariam “lá fora”, na terra das fadas, e não “dentro” de nós mesmos.8”
Certamente essa é a maneira imediata, primária, ingênua ou prática de considerarmos nosso mundo pensado. Se não houvesse um mundo perceptivo para servir como seu “redutor”, no sentido de Taine, sendo “mais forte” e mais genuinamente “exterior” (para que todo o mundo meramente pensado pareça fraco e interior em comparação), nosso mundo do pensamento seria o único mundo, e desfrutaria de uma realidade completa em nossa crença. Isto de fato acontece em nossos sonhos, e em nossos devaneios, contanto que as percepções não os interrompam.
E no entanto, assim como a sala observada (para voltar ao nosso último exemplo) é também um campo da consciência, assim também a sala concebida ou recordada é um estado da mente; e a duplicação da experiência tem, em ambos os casos, fundamentos semelhantes.
A sala pensada, a saber, tem muitos acoplamentos pensados com muitas coisas pensadas. Alguns desses acoplamentos são inconstantes, outros são estáveis. Na história pessoal do leitor, a sala ocupa uma única data — ele a viu apenas uma vez, talvez, há um ano. Quanto à história da casa, por outro lado, ela forma um ingrediente permanente. Alguns acoplamentos têm a curiosa obstinação dos fatos, para pegar emprestado o termo de Royce; outros mostram a fluidez da fantasia — nós os deixamos ir e vir conforme nos apraz. Agrupada com o resto de sua casa, com o nome de sua cidade, de seu proprietário, seu construtor, seu valor, sua planta decorativa, a sala mantém uma base definitiva, à qual, se tentarmos afrouxá-la, ela tende a retornar, e a se reafirmar com força9. Com esses associados, em resumo, ela é coerente, enquanto que em relação a outras casas, outras cidades, outros proprietários, etc., ela não mostra nenhuma tendência de coesão. As duas coleções, a primeira sendo a de suas coesões, e a segunda a de seus associados soltos, inevitavelmente vêm a ser contrastadas. Chamamos a primeira coleção de sistema de realidades externas, no meio da qual a sala, como ‘real’, existe; a outra chamamos de fluxo de nosso pensamento interno, no qual, como uma ‘imagem mental’, ela flutua por um momento10. Assim, a sala é novamente contada duas vezes. Ela desempenha dois papéis diferentes, sendo Gedanke e Gedachtes, o pensamento-de-um-objeto, e o objeto-pensado, ambos em um; e tudo isso sem paradoxo ou mistério, tal como a mesma coisa material pode ser baixa e alta, ou pequena e grande, ou má e boa, por causa de suas relações com partes opostas de um mundo ambiental.
Com ‘subjetivo’ dizemos que a experiência representa; enquanto com ‘objetivo’ dizemos que ela é representada. O que representa e o que é representado é aqui numericamente o mesmo; mas devemos lembrar que nenhum dualismo entre ser representado e representar reside na experiência per se. Em seu estado puro, ou quando isolada, não há qualquer divisão dela em consciência e aquilo de que a consciência é “de”. Sua subjetividade e objetividade são atributos funcionais apenas, realizados apenas quando a experiência é “considerada”, ou seja, falada, duas vezes, ponderada juntamente com seus dois contextos diferentes, respectivamente, por uma nova experiência retrospectiva, da qual toda essa complicação do passado forma agora o novo conteúdo.
O campo instantâneo do presente é sempre o que eu chamo de experiência ‘pura’. Ele é apenas virtualmente ou potencialmente tanto objeto quanto sujeito, até agora. Por enquanto, é simples, é uma realidade ou existência inqualificável, um simples aquilo. Nessa ingênua imediatez, é claro que ele é válido; está lá, agimos sobre ele; e a sua duplicação em retrospectiva para um estado da mente e uma realidade pretendida com isso é apenas um dos atos. O ‘estado da mente’, primeiro tratado explicitamente como tal em retrospecção, será corrigido ou confirmado, e a experiência retrospectiva, por sua vez, terá um tratamento semelhante; mas a experiência imediata em sua passagem é sempre “verdade”11, verdade prática, algo sobre o qual se deve agir, em seu próprio movimento. Se o mundo estivesse então e ali a apagar-se como uma vela, a verdade permaneceria absoluta e objetiva, pois seria “a última palavra”, não haveria crítica e ninguém jamais iria opor o pensamento nele contido à realidade pretendida12.
Acho que agora posso afirmar que deixei clara minha tese. A consciência conota uma espécie de relação externa, e não denota uma coisa ou forma de ser especial. A peculiaridade de nossas experiências, que não só são, mas são conhecidas, e que sua qualidade “consciente” é invocada para explicar, é melhor explicada por suas relações — tais relações sendo elas próprias experiências — umas às outras.
IV
Se eu agora continuasse a tratar do conhecimento do perceptual por meio de experiências conceituais, isso se revelaria novamente um assunto de relações externas. Uma experiência seria o conhecedor, a outra seria a realidade conhecida; e eu poderia perfeitamente definir, sem considerar a noção de ‘consciência’, ao que o conhecimento realmente e na prática equivale — conduzindo-adiante, a saber, e terminando-em percepção, através de uma série de experiências de transição que o mundo fornece. Mas não vou tratar disso, pois o espaço é insuficiente13. Vou antes considerar algumas objeções que certamente serão levantadas contra toda a teoria tal como ela está.
V
Antes de mais nada, isto será perguntado: “Se a experiência não tem existência ‘consciente’, se não é parcialmente feita de ‘consciência’, do que então ela é feita? A matéria conhecemos, e o pensamento conhecemos, e o conteúdo consciente conhecemos, mas a ‘experiência pura’, neutra e simples é algo que não conhecemos de modo algum. Diga em que consiste — pois deve consistir em algo — ou esteja disposto a desistir”!
A resposta a este desafio é fácil. Embora, por uma questão de fluência eu mesmo falei no início deste artigo de uma experiência pura, tenho agora que dizer que não há um material geral do qual a experiência em geral seja feita. Há tantas coisas quanto há “naturezas” nas coisas vivenciadas. Se você perguntar de que é feita qualquer coisa de experiência pura, a resposta é sempre a mesma: “É feita daquilo, do que aparece, do espaço, da intensidade, da planura, do marrom, do peso, ou do que não é. A análise de Shadworth Hodgson aqui não deixa nada a desejar. A experiência é apenas um nome coletivo para todas essas naturezas sensíveis, e salvo para o tempo e o espaço (e, se você quiser, para o ‘ser’) não aparecerá nenhum elemento universal do qual todas as coisas são feitas.
VI
A próxima objeção é mais formidável, na verdade parece bastante esmagadora quando se ouve pela primeira vez.
“Se é o mesmo pedaço de experiência pura, tomado duas vezes, que serve ora como pensamento e ora como coisa” — assim a objeção decorre — “como é que seus atributos devem diferir tão fundamentalmente nas duas leituras. Como coisa, a experiência se estende; como pensamento, ela não ocupa espaço ou lugar. Como coisa, ela é vermelha, dura, pesada; mas quem já ouviu falar de um pensamento vermelho, duro ou pesado? No entanto, mesmo agora você disse que uma experiência é feita apenas do que aparece, e o que aparece são apenas tais adjetivos. Como pode a única experiência em sua função-coisa ser feita deles, consistir neles, carregá-los como seus próprios atributos, enquanto que em sua função-pensamento ela os desdenha e atribui-os a outro lugar. Existe aqui uma autocontradição da qual o dualismo radical do pensamento e das coisas é a única verdade que pode nos salvar. Somente se o pensamento for um tipo de ser é que os adjetivos podem existir nele “intencionalmente” (para usar o termo escolástico); somente se a coisa for de outro tipo eles podem existir nela de maneira constitutiva e energeticamente. Nenhum sujeito simples pode receber os mesmos adjetivos e, em um momento, ser qualificado por eles, e em outro momento ser meramente um “de” deles, tal como alguma coisa apenas significada ou conhecida”.
A solução insistida por tal opositor, tal como muitas outras soluções de senso comum, aumenta à medida que se torna menos satisfatória, conforme mais alguém a considera. Para começar, o pensamento e as coisas são tão heterogêneos como se costuma dizer?
Ninguém nega que eles têm algumas categorias em comum. Suas relações com o tempo são idênticas. Ambos, além disso, podem ter partes (pois os psicólogos em geral tratam os pensamentos como tendo-as); e ambos podem ser complexos ou simples. Ambos são de tipos, podem ser comparados, adicionados, subtraídos e dispostos em ordens em série. Todos os tipos de adjetivos qualificam nossos pensamentos, que parecem incompatíveis com a consciência, sendo como tal uma diafaneidade nua. Por exemplo, eles são naturais e fáceis, ou trabalhosos. São belos, felizes, intensos, interessantes, sábios, idiotas, focais, marginais, insípidos, confusos, vagos, precisos, racionais, casuais, gerais, particulares, e muitas outras coisas. Além disso, os capítulos sobre ‘Percepção’ nos livros de Psicologia estão cheios de fatos que contribuem para a homogeneidade essencial do pensamento com a coisa. Como — se “sujeito” e “objeto” estivessem separados “pelo diâmetro total do ser” e não tivessem atributos em comum — poderia ser tão difícil dizer, em relação a um objeto material apresentado e reconhecido, qual parte chega através dos sentidos-orgãos e qual parte surge “da própria cabeça”? As sensações e as idéias aperceptivas fundem-se aqui tão intimamente que você não pode mais dizer onde uma começa e a outra termina, assim como não pode dizer, por meio daqueles panoramas circulares astuciosos que têm sido exibidos ultimamente, onde o verdadeiro primeiro plano e a tela pintada se unem14.
Descartes pela primeira vez definiu o pensamento como o absolutamente não-estendido, e mais tarde os filósofos aceitaram a descrição como correta. Mas que significado possível poderia se atribuir cuja a extensão — quando pensamos em uma régua de pés ou em um pátio quadrado — não seja atribuível ao nosso pensamento? De todo objeto estendido, o quadro mental adequado deve ter toda a extensão do próprio objeto. A diferença entre a extensão objetiva e subjetiva é somente de relação com um contexto. Na mente, as várias extensões não mantêm necessariamente uma ordem obstinada em relação umas às outras, enquanto no mundo físico elas se unem de forma estável e, somadas, formam a grande Unidade envolvente que nós consideramos e chamamos de Espaço real. Enquanto ‘externas’, elas portam-se negativamente, por assim dizer, umas às outras, excluem-se mutuamente e mantêm suas distâncias; enquanto como ‘internas’ sua ordem é solta, e formam um durcheinander no qual a unidade se perde15. Mas argumentar a partir disso que a experiência interna é absolutamente inextensiva parece-me um pouco absurdo. Os dois mundos diferem, não pela presença ou ausência de extensão, mas pelas relações das extensões que existem em ambos os mundos.
Este caso de extensão não nos coloca agora no caminho da verdade no caso de outras qualidades? Coloca; e me surpreende que os fatos não tenham sido notados há muito tempo. Por que, por exemplo, chamamos fogo de quente, água de molhada, e ainda assim nos recusamos a dizer que nosso estado mental, quando é “de” tais objetos, está molhado ou quente? ‘Intencionalmente’, em todo caso, e quando o estado mental é uma imagem vívida, o calor e o molhado estão tanto nele quanto na experiência física. A razão é esta: à medida que o caos geral de todas as nossas experiências é peneirado, descobrimos que há alguns incêndios que sempre queimarão paus e sempre aquecerão nossos corpos, e que há algumas águas que sempre apagarão os incêndios; enquanto que há outros incêndios e águas que não agirão de modo algum. O grupo geral de experiências que agem, que não só possuem suas naturezas intrínsecas, mas as usam de maneira adjectiva e energética, virando-as umas contra as outras, vem inevitavelmente a ser contrastado com o grupo cujos membros, tendo as mesmas naturezas, não as manifestam de maneira “energética”. Produzo agora para mim mesmo uma experiência de fogo abrasador; coloco-o perto do meu corpo; mas ele não me aquece minimamente. Coloco um pau sobre ele, e o pau ou arde ou permanece seco, como eu quiser. Invoco água, e a despejo sobre o fogo, e não há absolutamente nenhuma diferença. Eu sou responsável por todos esses fatos, chamando todo esse conjunto de experiências de irreal, um conjunto mental. O fogo mental é o que não queima paus reais; a água mental é a que não necessariamente (embora, é claro, possa) apagará nem mesmo um fogo mental. As facas mentais podem ser afiadas, mas não cortam lenha de verdade. Os triângulos mentais são pontiagudos, mas suas pontas não ferem. Com objetos “reais”, ao contrário, as consequências sempre se acumulam; e assim as experiências reais são separadas das mentais, as coisas daquilo que pensamos sobre elas, fantasiosas ou verdadeiras, e são precipitadas juntas como sendo a parte estável de toda a experiência-caos, sob o nome do mundo físico. Destas, nossas experiências perceptivas são o núcleo, sendo elas as experiências originalmente fortes. Acrescentamos muitas experiências conceituais a elas, tornando-as fortes também na imaginação, e construindo as partes remotas do mundo físico por seus meios; e em torno desse núcleo de realidade o mundo de fantasias e meros objetos rapsodicamente conectados flutua como um banco de nuvens. Nas nuvens, todos os tipos de regras são violadas, as quais no núcleo são mantidas. As extensões lá podem ser localizadas indefinidamente; o movimento lá não obedece às leis de Newton.
VII
Há uma classe peculiar de experiências às quais, quer as tomemos como subjetivas ou objetivas, nós designamos suas diversas naturezas como atributos, pois em ambos os contextos elas afetam seus associados ativamente, embora em nenhum deles tão “fortemente” ou tão acentuadamente quanto as coisas se afetam mutuamente por suas energias físicas. Refiro-me aqui às apreciações, que formam uma esfera ambígua do ser, por um lado, pertencentes às emoções e, por outro, tendo um “valor” objetivo, mas não parecendo ser nem interior, nem exterior, como se uma tormenta tivesse começado, mas não se tivesse completado.
As experiências de objetos dolorosos, por exemplo, são geralmente também experiências dolorosas; as percepções de amabilidade, de feiúra, tendem a passar por percepções tão amáveis ou tão feias; as intuições do moralmente elevado são intuições elevadas. Às vezes, o adjetivo vagueia como se não soubesse onde se fixar. Devemos falar de visões sedutoras ou de visões de coisas sedutoras? De desejos perversos ou de desejos de perversidade? De pensamentos saudáveis ou de pensamentos de objetos saudáveis? De bons impulsos, ou de impulsos para o bem? De sentimentos raivosos, ou de sentimentos de raiva? Tanto na mente quanto na coisa, estas naturezas modificam seu contexto, excluem certos associados e determinam outros, têm seus pares e incompatibilidades. Mas não tão teimosamente como no caso das qualidades físicas, pois a beleza e a fealdade, o amor e o ódio, o agradável e o doloroso podem, em certas experiências complexas, coexistir.
Se alguém fizesse uma construção evolutiva de como muitas experiências puras originalmente caóticas se diferenciaram gradualmente em um mundo interior e exterior ordenado, toda a teoria se basearia no sucesso de alguém em explicar como ou por que a qualidade de uma experiência, uma vez ativa, poderia se tornar menor, e, de ser um atributo energético em alguns casos, em outros, cair no status de uma “natureza” inerte ou meramente interna. Essa seria a ‘evolução’ do psíquico a partir do seio do físico, na qual as experiências estéticas, morais e de outra forma emocionais representariam um estágio de meio caminho.
VIII
Mas um último grito de non possumus provavelmente surgirá de muitos leitores. “Tudo muito bonito como uma peça de engenhosidade”, dirão eles, “mas nossa própria consciência intuitivamente contradiz você. Nós, de nossa parte, sabemos que estamos conscientes. Sentimos nosso pensamento, fluindo como uma vida dentro de nós, em absoluto contraste com os objetos que ele tão incessantemente acompanha. Não podemos ser infiéis a essa intuição imediata. O dualismo é um datum fundamental: que nenhum homem junte o que Deus separou”.
Minha resposta a isso é minha última palavra e lamento muito que, para muitos, isso soará materialista. No entanto, não posso ajudar, pois também eu tenho minhas intuições e devo obedecê-las. Deixemos que o caso seja aquilo que pode ser nos outros, eu estou tão seguro quanto estou de qualquer coisa que, em mim mesmo, a corrente de pensamento (que reconheço enfaticamente como um fenômeno) é apenas um nome descuidado para aquilo que, quando escrutinado, revela-se a consistir principalmente na corrente da minha respiração. O “eu penso”, que Kant disse que deve ser capaz de acompanhar todos os meus objetos, é o “eu respiro” que de fato os acompanha. Existem outros fatos internos além da respiração (ajustes musculares intracefálicos, etc., dos quais eu disse uma palavra em minha Psicologia maior), e estes aumentam os bens da ‘consciência’, na medida em que esta última está sujeita à percepção imediata; mas a respiração, que sempre foi a original do ‘espírito’, a respiração movendo-se para fora, entre a glote e as narinas, é, estou convencido, a essência da qual os filósofos construíram a entidade conhecida por eles como consciência. Essa entidade é fictícia, enquanto os pensamentos em concreto são totalmente reais. Mas os pensamentos em concreto são feitos das mesmas matérias que são as coisas.
Gostaria de acreditar que eu mesmo tenho tornado isso plausível neste artigo. Em outro artigo tentarei tornar ainda mais clara a noção geral de um mundo composto de experiências puras.

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Notas:
[1] Artigos de Baldwin, Ward, Bawden, King, Alexander e outros. O Dr. Perry está francamente acima da fronteira.
[2] Em minha ‘Psicologia’ tentei mostrar que não precisamos de outro conhecedor que não seja o ‘pensamento passageiro’.
[3] G. E. Moore: Mind, Vol. XII., N. S., p. 450.
[4] Paul Natorp: ‘Einleitung in die Psychologie,’ 1888, pp. 14, 112.
[5] “Figurativamente falando, pode se dizer que a consciência é o único solvente universal ou menstruum, no qual os diferentes tipos de atos psíquicos e os fatos são contidos, seja de forma oculta ou óbvia”. G. T. Ladd: ‘Psychology, Descriptive and Explanatory,‘, 1894, p. 30.
[6] Aqui, como em qualquer outro lugar, as relações são, naturalmente, relações experimentadas, membros do mesmo coletivo originalmente caótico de experiências não-percepcionais das quais os próprios termos relacionados são parte.
[7] Da função representativa da experiência não-perceptual como um todo, direi uma palavra em um artigo subsequente: ela leva muito longe na teoria geral do conhecimento para que muito possa ser dito sobre ela em um breve artigo como este.
[8] “Grundziige der Psychologie‘ Vol. I., p. 48.
[9] Cf. A. L. Hodder: ‘The Adversaries of the Skeptic,’ N. Y., 1899, pp. 94-99.
[10] Para simplificar, eu confino minha exposição à realidade “externa”. Mas há também o sistema de realidade ideal, no qual a sala desempenha seu papel. Relações de comparação, de classificação, de ordem serial, de valor, também são obstinadas, atribuem um lugar definido à sala, ao contrário da incoerência de seus lugares na mera rapsódia de nossos pensamentos sucessivos.
[11] Note a ambiguidade desse termo, que às vezes é tomado de forma objetiva e às vezes subjetivamente.
[12] Na Psychological Review de julho deste ano, o Dr. R. B. Perry publicou uma opinião sobre a Consciência que se aproxima mais da minha do que qualquer outra que eu conheça. Como presente, pensa o Dr. Perry, cada campo da experiência é deveras “fato”. Torna-se ‘opinião’ ou ‘pensamento’ apenas em retrospectiva, quando uma nova experiência, pensando o mesmo objeto, a altera e corrige. Mas a experiência corretiva se torna por sua vez corrigida, e assim a experiência como um todo é um processo no qual o que é objetivo originalmente para sempre se torna subjetivo, se transforma em nossa apreensão do objeto. Recomendo fortemente o admirável artigo do Dr. Perry aos meus leitores.
[13] Fiz um relato parcial do assunto em Mind, Vol. X., p. 27, 1885, e na Philosophical Review, Vol. II., p. 105, 1895. Ver também C. A. Artigo de Strong no JOURNAL OF PIIILOSOPHY, PSYCHOLOGY AND SCIENTIFIC METHODS, Vol. I., p. 253, 12 de maio de 1904. Espero voltar muito em breve ao assunto neste JORNAL.
[14] A prova de Spencer de seu “Realismo Transfigurado” (sua doutrina de que existe uma realidade absolutamente não-mental) vem à mente como um esplêndido exemplo da impossibilidade de estabelecer uma heterogeneidade radical entre o pensamento e as coisas. Todos os seus pontos de diferença dolorosamente acumulados vão gradualmente se deparando com seus opostos, e estão cheios de exceções.
[15] Falo aqui da vida interior completa na qual a mente joga livremente com seus materiais. Claro que o livre jogo da mente é restrito quando ela procura copiar coisas reais no espaço real.
Texto original extraído de Essays in Radical Empiricism.