O Falso Cristo de The Chosen – Michael Amorim

Apesar do estrondoso sucesso, The Chosen consegue retratar bem a mais importante figura do Cristianismo? É isso que tentarei responder nas linhas que se seguem.

Se você não esteve numa caverna nos últimos meses, provavelmente já ouviu falar ou até mesmo tenha visto a série de televisão The Chosen (Os Escolhidos). Uma série que busca retratar, usando e abusando de licença poética, a vida de Jesus e seus discípulos, imaginando, inclusive, cenas não registradas pelos autores do Novo Testamento da Bíblia.

The Chosen tornou-se uma verdadeira febre no mundo todo, e não demorou para ganhar versões dubladas distribuídas em diversos países. Na TV aberta brasileira, a série chegou através do SBT.

Mas o que dizer da produção, não enquanto ficção e puro produto de entretenimento, mas como obra que educa o imaginário de milhões de pessoas sobre teologia e história cristã? Apesar do estrondoso sucesso, The Chosen consegue retratar bem a mais importante figura do Cristianismo? É isso que tentarei responder nas linhas que se seguem.

Uma coisa que salta aos olhos a qualquer um que tenha visto algum episódio da série, é a forma como o diretor Dallas Jenkins concebeu a personalidade de Jesus Cristo. Ao contrário de produções já consagradas sobre a Vida de Jesus, em The Chosen encontramos um Cristo, interpretado por Jhonatan Roumie, descontraído e piadista, com tiradas de humor para quase todos os momentos. De longe isso é o que mais me causou antipatia na produção: essa figura de um Cristo cool com quem você facilmente tomaria uma cerveja – sem álcool, é claro. Imagino facilmente o Cristo de The Chosen segurando uma singela Heineken não alcoólica. Um Cristo que, longe de ser alguém de quem São João Batista disse não ser digno de desatar as sandálias, lembra muito aquele tiozão legal, formado em filosofia, que nunca larga o violão e usa gírias da moda para se enturmar com os jovens.

E por que esse Cristo demasiado alegre me incomoda tanto? “Jesus veio trazer felicidade ao mundo”, alguns dirão. Não penso que Nosso Senhor tenha sido carrancudo e mal humorado, longe disso. Sem dúvidas, O Filho de Deus tem um excelente senso de humor. Mas entre ser bem-humorado e ser um verdadeiro “hippie” existe um abismo de diferença. Jesus era homem, sim, mas não era qualquer homem.

Outros ainda dirão que “Muitas pessoas tiveram suas vidas transformadas por The Chosen, portanto, a série é boa e deve ser recomendada”. Minha resposta é que há infinitos relatos de vidas transformadas pelo guru Osho, um dos grandes charlatões de nossa época. Se tu estudares a vida do João de Deus, verás testemunhos belíssimos de quem encontrou cura e libertação em sua seita. Os fins não justificam os meios. O erro não deixa de ser erro por existir quem o defenda.

Já repararam, aliás, que ninguém diz que aprendeu alguma coisa de teologia ou catecismo com The Chosen? Apenas dizem que choraram e se emocionaram com o “Jesus humano“. O velho emocionalismo protestante que abole a razão e exalta os sentimentos. Nada de novo sob o sol.

O Jesus criado pelo diretor Dallas Jenkins (que é filho de um notório escritor anticatólico) não é o Jesus de dois mil anos de Tradição católica e, definitivamente, não é o Jesus Bíblico.

Retratar O Deus encarnado como sendo uma figura medíocre, extremamente comum e igual a todos nós, não é apenas um erro teológico, é uma blasfêmia. O corpo de Cristo, afinal, deve ser adorado tanto quanto Seu espírito. Na Transfiguração temos uma pequena amostra do quão grande e divino é O Filho do Homem. Definitivamente, Jesus não era um homem comum, como quer repassar Dallas Jenkins.

Na Paixão de Cristo de Mel Gibson, o melhor filme já feito sobre o sacrifício de Jesus, até os planos de câmera evidenciavam a grandeza de Cristo. Sempre, mesmo em momentos descontraídos, o Cristo interpretado pelo Jim Caviezel era retratado como um rei, com postura de rei. Além do fato de ser bem parecido com o Cristo do Sudário de Turin, uma importante relíquia que comprova a Ressureição. Não há nada disso em The Chosen. Em The Chosen, Jesus e seus discípulos são propositadamente medíocres.

Enquanto via o Jhonatan Roumie revirar os olhos antes de realizar um milagre e agir feito um adolescente na presença de São João Batista, lembrei-me de algo que G. K. Chesterton falava, grande e bem humorado escritor católico. Chesterton dizia que Cristo nos mostrou Sua ira, ao expulsar os vendilhões do tempo; nos revelou Sua tristeza, ao chorar com a morte de Lázaro; nos expôs Sua compaixão, ao perdoar a mulher adúltera; mas havia uma coisa que, por ser santa demais, Ele preferiu nos ocultar: Sua alegria.

Um Cristo humorista, ao ponto de ser bobo, que faz piadinhas irônicas em qualquer situação, ridiculamente sorridente, é um Cristo retirado de Sua Divindade e soberania. É o completo oposto do Cristo registrado nos Evangelhos e guardado pela Tradição. Você já se perguntou por que toda Igreja Católica tem no centro um crucifixo, ao contrário das igrejas protestantes, que nos apresentam uma cruz vazia?

Não foi simples coincidência que Jesus nunca foi retratado dançando nos vitrais ou revirando os olhos em sinal de tédio nas pinturas. Meditar em Sua dolorosa Paixão sempre foi a principal recomendação dos santos. Os Evangelistas fizeram questão de registrar a Transfiguração, o caminhar sobre as águas, as palavras de sabedoria, mas de que nos serviria saber que o Cristo também ia ao banheiro?

Mediocrizar a humanidade de Cristo é prova de total ignorância sobre o plano de Redenção. O Deus feito criatura, ao mesmo tempo em que rebaixa o Logos à humanidade, eleva o homem à divindade. O Deus feito homem está próximo de nós, mas ao mesmo tempo infinitamente distante. Há algum motivo para não sabermos nada da adolescência e juventude de Cristo, ou de fatos de sua vida íntima em Sua família. Impossível crer na Inspiração divina do Novo Testamento e ao mesmo tempo acreditar que o Espírito Santo esqueceu de registrar momentos importantes da vida de Cristo. O apóstolo São João diz que veremos Cristo como Ele É quando Ele se revelar. Ou seja, ainda não vimos O Filho de Deus em toda a Sua glória e majestade. Deus, ao revelar-Se, não perdeu o mistério que O envolve. Aliás, grande parte do Cristianismo é mistério. Mysterium fidei. A perda do mistério é o fim da Religião.

Por fim, é obvio que a série pode servir, e parece que tem servido, como meio de evangelização. Até por ser uma adaptação – mal-feita, a meu ver – de Cristo e Seus discípulos. E isso em meio a tanto lixo televisivo anticristão que se tem feito hoje em dia. No entanto, o tom jovial, o Cristo feio, baixinho e piadista, a quebra do arcano — há coisas que devem continuar sendo um mistério. Qual a necessidade de preencher as lacunas do texto bíblico sobre a vida dos discípulos? — e os erros teológicos totalmente nocivos à fé católica, como a Virgem Maria tendo dores de parto, levaram-me a conclusão de que a série causa mais malefícios que benefícios; no que pese toda a possível boa intenção dos atores e produtores envolvidos.

Esse falso Cristo serve bem para aqueles que negam a hierarquia do universo; para os que seguem o dogma de que todos são iguais; para os que não reverenciam a grandeza dos santos e do próprio Cristo; para aqueles que Cristo não passa de um de nós, nosso camarada, nosso “mano”; aqueles que vêem Nossa Senhora como uma mulher qualquer. Esse é o tipo de pessoa que vai vibrar com cada cena do seriado e quando menos esperar, estará rezando para o Jhonatan Roumie. Eu, enquanto católico, rejeito por completo o falso Cristo de The Chosen. Por amor a Ele, me recuso a aceitar essa caricatura mal-feita.


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Sobre o Autor ou Tradutor

Michael Amorim

Michael Amorim é casado com a Indiara Amorim e pai do João Lucas e do Luís Miguel. Mora em São Luís do Maranhão onde graduou-se em filosofia pela Universidade Federal do Maranhão – UFMA, e fundou o Instituto Cultural Carcarás. Também serve como acólito no convento carmelita Carmelo São José. Mais informações sobre o autor no Instagram: @michael25amorim.

7 thoughts on “O Falso Cristo de The Chosen – Michael Amorim

  1. EM DEFESA DA FÉ

    A tradição católica não é a teologia cristã. A fé católica não é a fé cristã. A fé cristã é a graça de Deus em Cristo, e este ressuscitado.

    Na verdade, a tradição católica foi protestada justamente porque mentia e omitia a verdade das Escrituras.

    Não há na série um Jesus APENAS como descrito, e APENAS dessa forma: piadista, legalzao, tiozao do final de semana e descolado, com piadas irônicas e falando a linguagem da juventude só para ser animador de plateia, e não bebedor de álcool. Isso é engraçado demais, inclusive.
    Jesus transformou a água em vinho, não em suco de uva naquele casamento. O que ele tomou com os discípulos na última ceia foi vinho, vinho de vinho, de verdade. Álcool.

    Me parece que esse Cristo inquieta tanto a ti, e a alguns católicos, mais porque você está ressentido com a série— que não é uma série católica feita para católicos, afim de disseminar e catequizar geral—, do que porque ela traz “um Jesus hippe good vibes não divino”. Também porque não ensinam tradições católicas, teologia católica. Ou seja, porque não é uma produção católica que vai espalhar a única verdade existente possível: a igreja Católica. Se reparar bem, eu disse “a igreja católica”, não “Cristo Jesus”. Porque para um católico genuíno, a palavra da tradição católica é a palavra final, não a de Cristo. Loucura, né?

    É o velho e antiquado catolicismo, que abole por completo as Escrituras, afim de preservar, primeiro, a tradição da igreja, depois “a gente vê se a bíblia concorda com a gente. O que não concordar, a gente exonera, sejam pessoas ou textos bíblicos”.
    (2CO 3.15-16)

    “O Jesus criado pelo diretor Dallas Jenkins (que é filho de um notório escritor anticatólico) não é o Jesus de dois mil anos de Tradição católica…”
    O Jesus de dois mil anos de tradição católica, definitivamente e bíblicamente, não é o Jesus bíblico.

    “Retratar O Deus encarnado como sendo uma figura medíocre, extremamente comum e igual a todos nós, não é apenas um erro teológico, é uma blasfêmia.”

    É muito engraçado ler isso. Porque realmente parece que católicos não leem a Bíblia. E SE leem, a ignoram dolosamente.
    Jesus de fato não era um homem comum no plano espiritual. Era divino e soberano, ele era extraordinário. Mas repare como a Bíblia diz como ele era, fisicamente comum, igual a todos nós.

    ‭Isaías 53:2-3 A21‬
    [2] Foi crescendo como renovo diante dele, como raiz que sai de uma terra seca; não tinha formosura nem beleza; quando olhávamos para ele, não víamos beleza alguma para que o desejássemos. [3] Foi desprezado e rejeitado pelos homens; homem de dores e experimentado nos sofrimentos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, foi desprezado, e não lhe demos nenhuma importância.

    E olha só do que ele participou quando estava em carne e sangue.

    ‭Hebreus 2:14-18 A21‬
    [14] Portanto, visto que os filhos compartilham de carne e sangue, ele também participou das mesmas coisas, para que pela morte destruísse aquele que tem o poder da morte, isto é, o Diabo; [15] e livrasse todos os que estavam sujeitos à escravidão durante toda a vida, por medo da morte. [16] Pois, na verdade, ele não auxilia os anjos, mas sim a descendência de Abraão. [17] Por essa razão era necessário que em tudo se tornasse semelhante a seus irmãos, para que viesse a ser um sumo sacerdote misericordioso e fiel nas coisas que dizem respeito a Deus, a fim de fazer propiciação pelos pecados do povo. [18] Porque naquilo que ele mesmo sofreu, ao ser tentado, pode socorrer os que estão sendo tentados.

    Jesus participou das mesmas coisas que nós. Carne e sangue tem fome, sede, sorri, brinca, se alegra, chora, clama, ora, canta, dança, anda, corre, abraça, abraça apertado, sofre, beija, dorme. Bem comum, não? Essas coisas para um ser humano de carne e sangue?

    É sério que o seu argumento mais forte sobre a suposta mediocridade de Jesus retratada na série está em falar sobre a aparência física dele, que ele era humano, que ele não era tão parecido como o Jesus que o Jim fez era ?

    Católicos e suas paixões por imagens e santos…

    “Você já se perguntou por que toda Igreja Católica tem no centro um crucifixo, ao contrário das igrejas protestantes, que nos apresentam uma cruz vazia?”

    Eu tenho a resposta.

    ‭Atos 1:9 A21‬
    [9] Depois de dizer essas coisas, ele foi levado às alturas enquanto eles olhavam, e uma nuvem o encobriu de seus olhos.

    Jesus foi levado às alturas. Logo, ele está nas alturas, assentado à destra de Deus. Se ele está nas alturas, então ele não está mais na cruz. Se ele não está mais crucificado e morto, mas sim nas alturas e vivo, por que ele ainda está preso num crucifixo na igreja católica?

    A cruz vazia anuncia Cristo ressuscitado. Aponta diretamente para a redenção absoluta consumada de uma vez por todas. A cruz da igreja Católica anuncia o sofrimento momentâneo da imolação do cordeiro. Um Jesus sofrido, que ainda sofre, que ainda está morto, fraco, abandonado, em vergonha e humilhação. Esse sofrimento já não existe mais. Jesus não está pendurado num madeiro.
    Eu vejo dessa forma esse crucifixo de vocês. Eu já sei que ele sofreu, todavia mais me interessa que ele ressuscitou e vive eternamente.

    Ele vive! Abba, Pai!

    Seu comentário mais me pareceu uma birra católica ressentida—e até infundada, eu diria, do alto da minha irrelevancia e ignorância—, porque o catolicismo não será passado adiante com a série — e fico feliz com isso, porque adorar santos, adorar Maria, que não é virgem, nem santa, nem intercessora porque ela está morta, é apostasia e idolatria —, do que uma genuina preocupação com a suposta tentativa da série de fazer Jesus um ser medíocre, humano, comum, e menos Deus, segundo você. (Como se isso fosse possível, fazer Jesus menos Deus tirando ou acrescentando traços inerentes a todos os seres humanos)

    Catolicismo não é a fé cristã. A igreja católica não é a fé cristã. A fé cristã é a graça de Deus em Cristo, e este ressuscitado.

      1. Dias atras vi um video no Instagram emque o Olavo de Carvalho diz que não mais é possível restaurar a Igreja Católica….infelizmente é verdade.

    1. Quanto ressentimento com o catolicismo e os católicos. E quanta mentira e julgamento. Dizer que os católicos abolem completamente as escrituras é absolutamente descabido. Lutero, em seu leito de morte, arrependeu-se amargamente de ter provocado a cisma da igreja, o que tem produzido até hoje (e seu extenso, mas não tão bem construído, comentário é a prova cabal) somente discórdias totalmente desprovidas de humildade e amor. Que os ensinamentos de Jesus te tragam luz e paz. Que tua religiosidade supere bairrismos e paixões de torcida organizada. Feliz Páscoa!

      1. Se formos encarar esse puxa cordas dessas diferenças, seguiremos assim por séculos; que é o que aconteceu. É a mesma disputa teológica retórica entre arminianos e calvinistas, considerando devidas medidas e proporções.

  2. Quanto ressentimento com o catolicismo e os católicos. E quanta mentira e julgamento. Dizer que os católicos abolem completamente as escrituras é absolutamente descabido. Lutero, em seu leito de morte, arrependeu-se amargamente de ter provocado a cisma da igreja, o que tem produzido até hoje (e seu extenso, mas não tão bem construído, comentário é a prova cabal) somente discórdias totalmente desprovidas de humildade e amor. Que os ensinamentos de Jesus te tragam luz e paz. Que tua religiosidade supere bairrismos e paixões de torcida organizada. Feliz Páscoa!

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