Minha aposta sobre o abrandamento da perfomance do Pablo Marçal pós-cadeirada: ele está seguindo uma lógica de copywriting de alguns modelos de narrativa que fizeram muita gente enriquecer nos últimos anos (inclusive ele), em especial o método AIDA.
Trata-se de chamar primeiro a Atenção, e até os articuladores de esquerda pegaram logo a questão toda dessa tal de “economia de atenção”, como se fosse algo inventado pelo marketing digital. É um erro, pois é um elemento constituinte da democracia representativa, e o que o Marçal opera de novo é a exposição, de forma caricata, do que se faz desde as primeiras eleições.
Ele é como aquele meme sobre o Comediante do Watchmen: o homem que entendeu que tudo na sociedade é teatro, é commedia dell’arte, pantomima como dizia o Collor, e veste a roupa de palhaço para entrar no jogo.
Com a Atenção vem a captação do Interesse, em que se cria na cabeça do cliente/eleitor/espectador (para o Marçal não há distinção entre os 3, coisa que ele percebe de forma consciente, ao contrário da maioria dos políticos, que agem em parte consciente, em parte inconscientemente em relação a essa indistinção) um cenário apocalíptico, aponta-se carências, inventa-se um vazio na alma desse CEP (cliente/eleitor/espectador, como passo a chamar a partir de agora) para que depois se possa introjetar um Desejo (que será preenchido pelo produto que ele está vendendo) nele.
Uma das estratégias mais bem sucedidas no marketing digital é a espetacularização da própria vida, em que você se apresenta como um modelo a ser idolatrado, de modo a constituir uma TRIBO em torno de você, e você possa vender o que quiser, porque as pessoas passam a lhe tomar como modelo a ser imitado: compram o produto que voê anuncia porque querem ser você, e não por querer o produto. Quem ler o ótimo Tribo, do Seth Godin, e conhece um pouco da teoria mimética de René Girard, vai entender bem essa estratégia.
A imitação se dá, num primeiro momento, na relação ante o MENTOR nessa Jornada do Herói que introjetam na cabeça do CEP, na qual alimenta a ilusão de ser o protagonista. Mas já está se operando por trás a construção de uma idolatria. É por isso que o Marçal fala pouco de seus projetos, ou até fala um tanto, mas a dinâmica narrativa concentra-se nos episódios replicáveis em que se acentuam as suas qualidades superiores enquanto se caricaturiza e vilaniza os rivais.
E é preciso acentuar que SEMPRE FOI ASSIM nas democracias representativas. O que Marçal faz de inédito é expor esse teatro, igual Hamlet expondo o crime de seu tio assassino e a traição de sua mãe numa peça apresentada na corte, peça que foi escrita pelo príncipe, ainda que não atuada por ele — Marçal se coloca como autor e ator.
Pois ele já cumpriu as etapas da A(tenção), do I(nteresse) e do D(esejo) do método AIDA. O último A é a A(ção), o que em linguagem de marketing digital é o CALL TO ACTION, e ação aqui é a de voto.
O primeiro momento foi encenado na cadeirada, e ele o fez com imenso sucesso. Agora é o momento de confirmar a venda de seu produto ao CEP (que não é a ação em si de voto, mas a idolatria, para que, perdendo ou ganhando a eleição, Marçal saia com uma lista de LEADS — mais uma vez linguagem de marketing digital — maior do que a que ele já tinha, e LEADS com grande potencial de fidelização).
O jogo no marketing digital é ganho não quando você faz um lançamento de sucesso para uma multidão de novos clientes, mas quando você conquista uma carteira de clientes que já compraram antes o seu produto e demonstram interesse em seguir comprando a sua marca — que não é o projeto político de Marçal, mas a pessoa dele.
Parte deste pensamento os amigos já devem ter visto em Pedro Sette Câmara, quanto à denúncia dos mecanismos miméticos no marketing digital, e em Silvio Grimaldo, na visão de que Marçal age igual o Comediante de Watchmen. O professor João Cezar de Castro também vem falando dentro dessa perspectiva, com a diferença de que oculta que esse sempre foi o jogo da esquerda supostamente democrática. Como se o espelho que ele aponta para o rival não tivesse dupla face.
Democracia representativa sendo engolida pelo marketing não é degeneração de um ideal, mas sua enteléquia.
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