São Boaventura

Boaventura de Bagnoregio (nascido por volta de 1221, falecido em 15 de julho de 1274) foi um franciscano, mestre em filosofia e teologia pela Universidade de Paris, Ministro Geral da Ordem dos Frades Menores (O.F.M.), bispo e cardeal da Igreja Católica Romana. Durante sua vida, ele se tornou um dos homens mais proeminentes do cristianismo latino. Todas as obras conhecidas de Boaventura derivam de sua carreira como estudante e mestre em teologia na Universidade de Paris e de sua carreira como Ministro Geral. Em todo o seu corpus, São Boaventura testemunha sua formação filosófica e faz afirmações filosóficas que influenciaram pensadores posteriores. Talvez ele seja mais conhecido atualmente por sua obra Itinerário da Mente Para Deus, um clássico filosófico, teológico e espiritual.

1. Vida e Obras

Boaventura nasceu em Civita di Bagnoregio, no centro da Itália, uma cidade antiga situada no topo de um monte vulcânico em constante erosão. Embora Dante tenha colocado Boaventura entre os santos em seu Paradiso (Canto 12), e relatos da santidade de Boaventura tenham circulado nos séculos XIII e XIV, nenhum culto oficial surgiu após sua morte e o papado não o reconheceu como santo até 1482 (sobre a canonização de Boaventura, consulte Finucane 2011: 33-70). Se Boaventura tivesse sido canonizado antes, talvez houvesse mais informações sobre sua vida para serem analisadas, como no caso de seu contemporâneo, Tomás de Aquino. O que podemos saber sobre o início da vida de Boaventura vem de sua própria obra hagiográfica sobre São Francisco de Assis, a Legenda maior e minor, onde ele atesta ter sido curado milagrosamente por São Francisco:

Quando eu era menino, como ainda me lembro vividamente, fui arrebatado das garras da morte por sua invocação e méritos. (Legenda maior, prol. 3, [FA:ED: Volume 2, 528]; cf. Legenda minor, lec. 8. Os textos de Boaventura serão citados na edição de Quaracchi, 1882-1902, a menos que exista uma edição mais recente1)

Uma determinada data, a da eleição de Boaventura como Ministro Geral dos Franciscanos em 2 de fevereiro de 1257, permite uma ampla divisão de sua vida em dois períodos claros: um acadêmico e um pastoral2. O período acadêmico vai de 1235 a 1257. Durante esses anos, Boaventura estudou e lecionou filosofia e teologia na Universidade de Paris e obteve o grau de mestre em ambas as disciplinas. O período pastoral vai de 1257 a 1274. Durante esse período, Boaventura serviu como Ministro Geral, renunciando ao cargo em 19 de maio de 1274, quando Jerônimo de Ascoli foi eleito para substituí-lo. Em 28 de maio de 1273, Boaventura tornou-se cardeal e, mais tarde, foi consagrado bispo de Albano (11 de novembro de 1273). Boaventura morreu no segundo concílio de Lyon, em 15 de julho de 1274.

Uma cronologia mais completa do período acadêmico de Boaventura pode surgir da análise de várias crônicas e da utilização dos dados do conhecimento crescente que os estudiosos têm sobre a Universidade medieval de Paris e seus programas de graduação. O consenso geral continua sendo o de que Boaventura deixou Bagnoregio e foi para Paris em 1235 e estudou filosofia até 1243. O livro-guia de um estudante da faculdade de artes de Paris (c. 1240) oferece um vislumbre do treinamento de Boaventura, enquanto suas próprias obras mostram seu domínio dessa disciplina (anônimo, Le “guide de l’étudiant”). Boaventura claramente conhecia e utilizava o corpus emergente de Aristóteles e seus comentaristas árabes. O programa parisiense de artes privilegiava a lógica e Boaventura dominava e utilizava essa arte, demonstrando sua maestria na discussão de questões metafísicas e teológicas. Um texto como os Sumários de Lógica de Pedro da Espanha (século XIII) mostra o tipo de treinamento lógico que Boaventura provavelmente recebeu. Notavelmente, os estudiosos ainda não identificaram nenhuma obra do período de Boaventura como estudante ou mestre de filosofia em Paris.

Em 1244, Boaventura havia concluído sua graduação em filosofia e era um frade franciscano professo. A Carta a um Mestre Desconhecido de Boaventura (comumente datada de meados da década de 1250) fornece algumas informações sobre o motivo pelo qual ele escolheu os franciscanos e mostra sua atitude em relação à filosofia nessa época:

E assim, se os escritos dos filósofos às vezes são de grande valor para compreender a verdade e refutar os erros, não estaremos nos afastando da pureza da fé se por vezes os estudarmos, especialmente porque há muitas questões de fé que não podem ser resolvidas sem recorrer a eles. (trans. Monti 1994: 53)

O corpus de Boaventura mostra que, embora ele pudesse criticar profundamente as posições que identificava como erros filosóficos (especialmente em sua última obra, Collationes in Hexaëmeron), ele utilizava consistentemente a filosofia e os autores filosóficos em seus escritos teológicos e espirituais.

De 1243 a 1248, Boaventura estudou teologia em Paris, certamente trabalhando em estreita colaboração com os mestres franciscanos desse período: Alexandre de Hales (falecido em 1245), João de La Rochelle (falecido em 1245), Eudes Rigaud (mestre entre 1245 e 1248) e depois Guilherme de Middleton (mestre entre 1248 e 1254). Nesse ponto, Salimbene fornece outra data importante, mas que requer alguma interpretação. Escrevendo por volta de 1280, Salimbene afirma:

Fr. João de Parma [ministro geral franciscano] deu licença a Fr. Boaventura de Bagnoregio para ler em Paris, o que ele nunca havia feito porque ainda não estava instalado em uma cátedra. Ele então leu todo o Evangelho de São Lucas, um comentário que é muito bonito e completo. Isso foi em 1248. (Salimbene, Cronica [Hodder-Egger: 209] e Hammond 2009)[4]

O testemunho de Salimbene não pode significar que João de Parma concedeu a Boaventura uma licença em teologia da Universidade de Paris, uma vez que João não tinha autoridade para conferir esse grau. A licença que João concedeu a Boaventura deve, portanto, ter sido interna à Ordem. Talvez João tenha feito de Boaventura um leiturista ou lhe tenha concedido o que os estudiosos chamam de segunda cátedra interna dos franciscanos em Paris. De qualquer forma, a interpretação usual é que Boaventura lecionou sobre o conteúdo da Bíblia como um cursorie “Bacharel em Bíblia”, entre 1248 e 1250/51. Em seguida, entre 1252 e 1253, ele comentou as Sentenças, provavelmente lecionando sobre todas as Sentenças em um ano, na típica ordem I-IV-II-III. Uma vez mestre, ele revisou o Comentário (Commentaria in Quattuor Libros Sententiarum), sua principal obra filosófica e teológica. Em 1253, ele era um “bacharel formado” em teologia, desempenhando as três funções de um mestre: dar aulas sobre a Bíblia, participar de disputas e pregar. Em 1253, os mestres e estudantes da Universidade de Paris entraram em greve, todos menos os frades. Os dois mestres dominicanos e o franciscano William de Middleton continuaram a lecionar e se recusaram a fazer um juramento de lealdade à Universidade. Eles foram expulsos da “universidade de mestres”, uma ação defendida pela Universidade em uma carta de 4 de fevereiro (Chartularium Universitatis Parisiensis I, no. 230: 252-8, trans. Thorndike 56–64). Boaventura recebeu a licentia docendi na Páscoa de 1254, em meio a esse conflito. Ele assumiu imediatamente a cátedra franciscana de teologia, mas lecionou apenas no convento franciscano, sem o reconhecimento da Universidade.

Boaventura realizou todas as três tarefas de um Mestre em Teologia de 1254 a 1257. Ele revisou seu comentário sobre Lucas e compôs comentários sobre João e Eclesiastes. Ele também realizou três conjuntos de questões disputadas. As questões Sobre o Conhecimento de Cristo (De scientia Christi), que desenvolvem sua teoria de iluminação do conhecimento, podem ser de 1254. As questões Sobre o Mistério da Trindade (De mysterio Trinitatis), que elaboraram sua concepção de Deus, certamente se seguiram a Sobre o Conhecimento de Cristo, pois citam essa disputa. Boaventura também disputou um terceiro conjunto de questões Sobre a Perfeição Evangélica (De perfectione evangelica). Essas questões defendiam o modo de vida dos frades dos ataques de mestres não-mendicantes liderados por Guilherme de St. Amour em 1255 (Bougerol 1982; Traver 1995 e 1999). Em outubro de 1256, o papa Alexandre IV ordenou que os mestres seculares de Paris aceitassem Boaventura e o dominicano Tomás de Aquino em seus devidos lugares como mestres de teologia, mas só o fizeram em 12 de agosto de 1257. Seis meses antes, Boaventura havia sido nomeado Ministro Geral. Além dos escritos normais relativos às suas tarefas como Mestre de Teologia, Boaventura produziu vários sermões durante esse período. Um texto, relacionado ao gênero de sermões e conhecido como Sobre a Redução das Artes à Teologia (Opusculum de reductione artium ad theologiam) pode ter se originado como a segunda metade do sermão inaugural de Boaventura como Mestre em Teologia (Benson 2012). Em 1257, ao deixar a Universidade e iniciar seu mandato como Ministro Geral, Boaventura também conseguiu compor seu Breviloquium, uma síntese breve e popular da teologia.

Conforme observado acima, o “período pastoral” de Boaventura vai de 1257 a 1274. Os estudiosos podem frequentemente identificar as atividades de Boaventura nessa época utilizando seus sermões e estudando documentos relacionados à Ordem Franciscana (Quinn 1974; Bourgerol (ed.) 1990). Boaventura viajou muito para visitar as casas franciscanas, mas manteve Paris como sua residência principal (Monti 2014). Durante esse período, os escritos de Boaventura refletiam as necessidades da Ordem, mas ele não deixou de lado sua formação filosófica e teológica parisiense. Boaventura rapidamente estabeleceu uma direção firme para a Ordem em uma “carta encíclica” a todos os frades em 23 de abril de 1257, que os admoestava a recuperar o brilho “um tanto manchado” da Ordem (Monti 1994). Em meio a seus outros deveres, Boaventura compôs três tratados extremamente populares entre 1257 e 1260 para o treinamento espiritual dos frades: Um Solilóquio sobre Quatro Exercícios Mentais (Soliloquium de quatuor mentalibus exercitiis), A Árvore da Vida (Lignum vitae) e A Via Tríplice (De triplici via) (Coughlin 2006; Cousins 1978).

A obra mais popular de Boaventura atualmente também foi composta nessa época. Para o dia da festa de Francisco, em outubro de 1259, Boaventura visitou o Monte Alverna, o mesmo lugar onde o próprio Francisco havia recebido uma visão mística de Cristo “sob a aparência” de “um serafim com seis asas” e havia “impresso em sua carne” os estigmas ou feridas de Cristo (Legenda maior 13.3 [FA:ED: Volume 2, 632-633]). Nesse ponto, Boaventura concebeu a idéia de seu Itinerário da Mente para Deus (Itinerarium mentis in Deum), uma jornada mental e espiritual para Deus cujo esboço básico — embora não seus detalhes — poderia ser compreendido até mesmo pelo frade mais simples (Armstrong 2020 é a tradução inglesa mais recente, oferecendo extensas notas). O texto mostra o treinamento filosófico e teológico de Boaventura a serviço da articulação de como contemplar Deus. A jornada segue a rota traçada pela primeira vez por Santo Agostinho — do mundo exterior para a mente interior, e da mente humana interior, mas inferior, para a mente superior, ou seja, para Deus. Boaventura entendeu que as seis asas do serafim angélico que Francisco viu representam seis maneiras de se aproximar de Deus. Entre outras coisas, a série de seis capítulos também representava para Boaventura os seis dias da criação. Portanto, ele organizou seu Itinerário em seis capítulos de trabalho mental, seguidos de um sétimo capítulo sobre o descanso místico. As duas asas inferiores do Serafim simbolizam ver Deus por meio de “pegadas (vestigia)”, sinais no mundo sub-humano que apontam para Deus, incluindo sinais no próprio universo físico (c. 1) e sinais encontrados na vida sensorial que os humanos têm em comum com outros animais (c. 2). As duas asas centrais do serafim simbolizam a visão de Deus em sua “imagem”, ou seja, nos seres humanos entendidos como portadores, em sua natureza intelectual, de sinais especiais que apontam para Deus. Aqui Boaventura distinguiu os sinais de Deus encontrados no exercício “natural” da mente no conhecimento teórico (c. 3) daqueles encontrados em seu exercício na esfera prática “reformada pela graça” (c. 4). As duas asas mais altas do Serafim simbolizam a visão da luz de Deus, primeiro na forma como a razão vê Deus como tendo uma natureza divina (c. 5) e depois como a fé vê Deus na Trindade de pessoas (c. 6). Esses três conjuntos de “passos” gêmeos culminam no “transporte mental e místico” encontrado na experiência mística (c. 7), o fim do Itinerário. Para cada passo, Boaventura usou material de escritos anteriores; mas o Itinerário, como todas as suas obras posteriores, é uma síntese que o Ministro Geral nunca teve tempo de expandir. No Itinerário, ele consegue uma combinação de imagens das escrituras, profundidade filosófica, anseio místico e uma densidade mais meditativa do que demonstrativa, como convém ao gênero do texto. O Itinerário, no entanto, fornece um esboço apropriado para analisar a filosofia de Boaventura, que será abordada a seguir.

O Capítulo Geral de 1260, organizado em Narbonne, na França, o primeiro em que Boaventura presidiu, ratificou sua codificação dos estatutos legais sob os quais os franciscanos viviam, conhecida como “Constituições de Narbonne”, e também lhe pediu que escrevesse uma Vida de São Francisco definitiva, o que ele fez em 1261. Essas duas obras colocaram a Ordem em um curso moderado que durou séculos e levou os franciscanos a reverenciar Boaventura como seu “segundo fundador”.

Durante a maior parte do período de 1257 a 1266, Boaventura percorreu a França e a Itália a pé, como faziam todos os frades quando viajavam. Em 1266, retornou a Paris, onde seus frades estavam sendo atacados tanto pelos conservadores da faculdade de Teologia quanto pelos radicais das Artes. Boaventura começou a dar uma série de colações (sermões oferecidos pela manhã e à noite) que ele considerava uma sequência: Colações sobre os Dez Mandamentos (Collationes de decem praeceptis), na Quaresma de 1267; Colações sobre os Sete Dons do Espírito Santo (Collationes de septem donis Spiritus sancti), na Quaresma de 1268; e Colações sobre o Hexaëmeron (Collationes in Hexaëmeron) durante a Páscoa de 1273, uma série que nunca foi concluída e que é frequentemente considerada uma obra-prima da teologia medieval. Embora as questões abordadas nessas colações abranjam quase toda a teologia cristã, elas passaram a ser entendidas como o momento mais polêmico de Boaventura, uma vez que nelas ele ataca os três erros filosóficos que acredita serem os mais perigosos: a eternidade do mundo, a necessidade do destino e a existência de um único intelecto para todos os seres humanos (sobre essas colações, consulte Ratzinger 1959 [1971] e 20093). Boaventura acreditava que todos esses três erros minavam a fé cristã, sendo que o último dos três afetava a própria doutrina da salvação. Notavelmente, a série de colações se aproxima do dia 10 de dezembro de 1270, quando certas posições aristotélicas foram condenadas pelo bispo de Paris, Étienne Tempier.

Além dessas importantes colações, em 1269, Boaventura defendeu novamente a vida mendicante das críticas do clero secular em sua Apologia Pauperum (Defesa dos Mendicantes). O último período da vida de Boaventura o viu crescer e se tornar um dos homens mais proeminentes da cristandade. Durante os três anos de vacância papal, de 29 de novembro de 1268 a 1º de setembro de 1271, Boaventura pregou um importante sermão em Viterbo e talvez tenha sido fundamental para pôr fim à vacância. Diz-se que os eleitores lhe ofereceram o papado e que, em vez disso, ele sugeriu Teobaldi Visconti. Após a eleição de Teobaldi como Papa Gregório X, ele nomeou Boaventura cardeal em 28 de maio de 1273 (Franchi, 1981); (Bartolomeu de Pisa, a fonte mais antiga para Boaventura, sugerindo o nome de Teobaldo, escreveu ca. 1385.). No Segundo Concílio de Lyon, Boaventura trabalhou pela reunificação das Igrejas oriental e ocidental, uma meta importante do Concílio que parecia ter sido alcançada quando ele subitamente adoeceu em 15 de julho de 1274. As atas do concílio relatam o seguinte

Na hora das matinas, faleceu Irmão Boaventura, de feliz memória, bispo de Albano, que era um homem eminente por sua ciência e eloquência (homo eminentis scientie et eloquentie), um homem notável por sua santidade e reconhecido pela excelência de sua vida, tanto religiosa quanto moral… Irmão Pedro de Tarantasia [também cardeal] celebrou a missa fúnebre e pregou sobre o tema “Estou triste por ti, meu irmão Jônatas”. Houve muitas lágrimas e muito choro, pois o Senhor lhe havia concedido tal graça que os corações de todos que o viam eram tomados pelo desejo de seu amor. (Franchi 1965: 95; em Bougerol, 1988: 11)

2. Filosofia, Fé e Teologia

Sem exceção, cada palavra de filosofia que Boaventura escreveu está contida em obras explicitamente religiosas — em sermões, obras de orientação espiritual e teologia. Ele nunca escreveu o tipo de introdução aos princípios da metafísica e da filosofia natural que Tomás de Aquino compôs em seu Sobre o Ente e a Essência (De ente et essentia) e Sobre os Princípios da Natureza (De principiis naturae), nem foram identificados comentários sobre as obras de Aristóteles sob seu nome. Os estudiosos que escreveram durante o renascimento neotomista do século XX compararam Boaventura com três outros pensadores: Aristóteles, Agostinho e Aquino. P. Mandonnet achava que ele não tinha filosofia própria, mas que era um teólogo agostiniano, puro e simples, cujas conclusões dependiam da fé. E. Gilson achava que Boaventura desenvolveu uma filosofia agostiniana em sua teologia:

Com São Boaventura, a síntese mística do agostinianismo medieval foi totalmente formada, assim como a do aristotelismo cristão foi totalmente formada com São Tomás. (Gilson 1924 [1938: 490]).

F. Van Steenberghen considerava sua filosofia um aristotelismo fracassado, distinto de sua teologia agostiniana, mas a serviço dela. Nenhuma dessas interpretações capta bem a relação de Boaventura com esses três filósofos ou sua própria abordagem das relações entre razão, fé e teologia, porque elas empregaram implicitamente um modelo tomista para ser um aristotélico, com o resultado de que os fracassos de Boaventura derivariam do fato de ele não ser o tipo de aristotélico que Tomás de Aquino era.

A abordagem de Boaventura a Aristóteles era bem diferente da de Alberto e Tomás. Ele não sentia necessidade de conhecimento detalhado do texto de Aristóteles. Como estudante de Artes, ele havia aprendido com seus mestres, e não com o estudo detalhado do texto de Aristóteles, os princípios filosóficos aristotélicos em geral — as categorias e os transcendentais, as causas e os predicáveis, e noções fundamentais como potência e ato, possível e necessário — suficientes para fazer seu próprio trabalho. Como filósofo e teólogo, ele era perfeitamente capaz de usar esses princípios emprestados para tirar suas próprias conclusões, as quais, segundo ele mesmo, dependiam mais de Alexandre de Hales do que de qualquer filósofo:

Pois não tenho a intenção de defender novas opiniões, mas de recompor as opiniões comuns e aprovadas (“Praelocutio“, Quaracchi II: 1a, trans. autores).

Consequentemente, Boaventura não foi um aristotélico fracassado pela simples razão de que ele nunca tentou ser um aristotélico à maneira dominicana. Por outro lado, embora Agostinho fosse claramente a autoridade teológica favorita de Boaventura, ele não era, propriamente falando, um agostiniano. Mesmo quando tira conclusões agostinianas, Boaventura não emprega argumentos agostinianos. Na verdade, Boaventura era, em termos gerais, um aristotélico em seus princípios filosóficos, mas não em suas conclusões. Uma maneira melhor de descrever suas conclusões filosóficas e sua maneira de tirá-las é que seu pensamento era franciscano na inspiração e bonaventurino na execução.

A questão premente relativa à filosofia, à fé e à teologia na década de 1250 era a de como estabelecer a teologia como uma ciência demonstrativa aristotélica. Alberto havia feito isso em seu comentário sobre as Sentenças (1243-1249), que Boaventura tinha em mãos quando escreveu seu próprio comentário. Demonstração é conhecimento causal, e uma ciência, no sentido de Aristóteles, é o conhecimento sistemático de um assunto limitado, desenvolvido por meio da demonstração de conclusões necessárias, fazendo uso de certos princípios causais fundamentais relevantes para o assunto em questão. A tarefa que a teologia se propôs, então, foi descobrir e apresentar sistematicamente as verdades estabelecidas naquele que é o mais assistemático dos livros — a Bíblia.

Como uma “ciência” é um conhecimento causal, Boaventura dedicou as quatro perguntas do prólogo ao seu comentário sobre o Livro 1 das Sentenças, que serve como introdução a toda a “ciência” da teologia, às suas quatro causas — eficiente, final, formal e material. Essas causas, por sua vez, esclarecem as relações entre filosofia, fé e teologia.

Como a ciência existe como um hábito intelectual na mente do conhecedor, a causa eficiente de qualquer livro de teologia é o autor que o escreveu, Pedro Lombardo no caso de suas Sentenças, e o próprio Boaventura no caso de seu comentário. Lombardo não foi um mero escriba, compilador ou comentarista; ele foi um “autor”, e o mesmo se aplica ao próprio Boaventura. Esse simples ponto distingue a fé, cuja única causa eficiente é Deus operando por meio da graça, tanto da filosofia quanto da teologia, cuja causa eficiente é a mente humana, embora mesmo aqui Deus tenha um papel a desempenhar.

Ao esclarecer o fim da teologia, Boaventura entendeu que Aristóteles havia distinguido nitidamente a ciência prática — cujo fim são os atos — da ciência teórica — cujo fim é o conhecimento. Assim, ele pergunta se a teologia é “em prol da contemplação ou em prol de nos tornarmos bons”. A resposta é que a teologia é mais perfeita do que qualquer ciência filosófica porque ela rompe os limites dessa dicotomia aristotélica. Nem o conhecimento teórico nem os atos práticos chegam ao centro da vida moral, que é o amor — tanto a “afeição” do amor quanto a virtude teológica da caridade. O tipo de virtude intelectual que prepara a mente para a caridade é uma “sabedoria” que “envolve conhecimento e afeição juntos”. O “conhecimento de que Cristo morreu por nós”, por exemplo, é muito diferente do conhecimento do geômetra ou do conhecimento do general. Consequentemente, a sabedoria teológica é tanto

em prol da contemplação e também para nos tornarmos bons, mas principalmente em prol de nos tornarmos bons (Quaracchi III: 13b; trans. Houser e Noone 2013: 12)

por meio da vivificação de nossos conhecimentos e ações com a “afeição” cristã.

A forma que produz a “ciência” é seu “método de proceder”. Ora,

o fim impõe a necessidade dos meios, já que “os dentes são afiados para cortar”, tal como diz Aristóteles.

Uma vez que a teologia é “projetada para promover a fé”, ela emprega “o método de argumentação ou investigação” desenvolvido pela primeira vez por Aristóteles. Ao adaptar o método filosófico aos dados da fé, a teologia tenta “confundir os adversários da fé”, “fortalecer os fracos em sua fé” e “deleitar aqueles cuja fé é completa”. Boaventura situou a teologia dentro da hierarquia das ciências, referindo-se à noção de Aristóteles de “ciências subalternas”. O filósofo reconheceu que a óptica —  que estuda as linhas visíveis —  é uma ciência “subalterna” à geometria — que estuda as linhas como tais. A teologia depende das Escrituras de maneira semelhante, pois as Escrituras oferecem certas verdades nas quais se deve acreditar, mas a teologia analisa as mesmas verdades “conforme se tornam inteligíveis”. Dessa maneira, a teologia é diferente da fé que ela tenta entender e da Escritura que nos oferece a fé (In I Sent. prol. q. 1 ad 5m; 2c [Quaracchi I: 8b]; trans. Houser e Noone 2013, 5).

Para entender a teologia como uma “ciência” que torna a fé inteligível, Boaventura deve esclarecer sua causa material. Determinar a causa material da teologia é o mesmo que se estabelecer quanto ao seu tema (seu sujeito). Sobre esse ponto, houve uma disputa considerável entre os Mestres. As “ciências” de Aristóteles eram todas limitadas a um gênero específico, como “animal”, “alma”, “memória” ou “ética”. Até mesmo sua ciência universal, a metafísica, limitava-se a estudar as substâncias; ela evitava as outras categorias. A teologia, por outro lado, atravessa todos os gêneros e inclui Deus, que não está confinado em nenhum gênero. Boaventura estava familiarizado com muitos relatos sobre o tema da teologia: “coisas e sinais”, a obra de “reparação do pecado”, “Cristo-cabeça e membros”, “Deus” e “o objeto da crença” (credibile). Para esclarecer essas questões conflitantes, Boaventura recorreu ao seu estudo das artes. Prisciano havia observado três sentidos diferentes para o tema da gramática. Seu objeto no sentido de seu “princípio raiz” é a “letra” que compõe as palavras; seu objeto concebido como um “todo integral” é “uma oratória adequada e completa”; e seu objeto concebido como “todo universal” é “som significativo, articulado e ordenado”. Há três sentidos correlatos do objeto de estudo da teologia: “Deus” é o “princípio” do tema e “Cristo-cabeça e membros” é o “todo integral”, a totalidade do que a teologia estuda. Mas o sentido mais importante de “tema” é o “todo universal”. Portanto, “o tema deste livro, propriamente falando”, é o “objeto da crença”, um tema que permite que a teologia abranja todas as realidades e todos os pensamentos sobre os quais se pode ter fé religiosa. (Quaracchi I: 6-8; trans. Houser e Noone 2013, 1-6).

Boaventura não aborda explicitamente os princípios da teologia. No entanto, ele esclarece seu “assunto” de uma forma que aponta para esses princípios. À fé, as Escrituras acrescentam a noção de “autoridade”, e à fé e à autoridade da revelação das Escrituras, a teologia acrescenta “prova”. A teologia pressupõe a fé, mas acrescenta a ela demonstrações racionais sobre questões de fé. Consequentemente, Boaventura acrescenta uma qualificação reveladora à sua descrição do tema da teologia. O tema da teologia é o objeto da crença

na medida em que o objeto da crença passa para a inteligibilidade pela adição do raciocínio. prout tamen credibile transit in rationem intelligibilis, et hoc per additionem rationis. (In I Sent. prol., q. 1 conclusio [Quaracchi I: 7b]; trans. Houser e Noone 2013, 4)

Com essa fórmula concisa, Boaventura inclui na teologia tanto a crença religiosa transformada por argumentos da razão natural quanto a razão natural transformada por argumentos baseados na revelação religiosa. Se assim for, então a teologia deve ter os tipos de princípios que possibilitam ambos os tipos de argumentos: as verdades fundamentais da fé extraídas da Bíblia e da tradição, mas também as verdades fundamentais da razão. O que torna todas essas verdades elementares em teológicas é sua função argumentativa. Os argumentos teológicos podem se basear na revelação, usando verdades reveladas como premissas, e podem se basear na razão, usando verdades racionais como premissas. Ambos os tipos de argumentos são teológicos devido ao uso que fazem. Dessa maneira, o raciocínio filosófico tem um lugar integral no domínio da teologia de Boaventura.

Boaventura mostrou como o raciocínio filosófico funciona na teologia pela própria estrutura de sua controversa questão Sobre o Mistério da Trindade. Cada pergunta é dividida em dois artigos, o primeiro provado usando premissas racionais e o segundo provado usando premissas extraídas da fé. Na Questão 1, por exemplo, prova-se racionalmente a existência de Deus no Art. 1 e, em seguida, mostra-se que Deus é uma trindade de pessoas usando argumentos baseados na fé e na razão no Art. 2. A teologia, portanto, consiste fundamentalmente no entendimento que resulta da união de argumentos racionais e argumentos baseados na fé4. O mesmo modo de raciocínio é encontrado em Sobre a Redução das Artes à Teologia. Aqui a “Redução” consiste em desenvolver analogias que movem a mente das artes liberais para a teologia e vice-versa. Boaventura argumenta a favor de cada ponto combinando uma afirmação baseada na razão com outra baseada na revelação, como se fossem a parede e o contraforte da catedral da teologia. O raciocínio filosófico, portanto, é uma parte absolutamente integral da teologia baseada na fé de Boaventura.

3. Criação Física

Na primeira etapa do Itinerário, Boaventura se concentra nos objetos sensíveis do mundo físico ao nosso redor, tanto considerados em si mesmos quanto em referência à nossa percepção sensorial deles. Como todas as criaturas, as coisas sensíveis são entendidas como sinais que, em última análise, podem direcionar os seres humanos para a arte ou sabedoria divina por meio da qual todas as coisas foram feitas. A semiótica de Boaventura distingue quatro tipos de sinais. Todas as criaturas podem ser vistas como “sombras” (umbra) e “vestígios” (lit. pegadas, vestigia):

Pois uma criatura é chamada de sombra com base em suas propriedades que apontam para Deus em algum tipo de causalidade de forma indeterminada. Entretanto, uma criatura é chamada de vestígio com base em propriedades que apontam para Deus como causa tripla — causa eficiente, formal e final; por exemplo, as propriedades: um, verdadeiro e bom. (In I Sent. d. 3, pars 1, q. 2, ad 4 [Quaracchi I: 73b], trans. Houser e Noone, 77-78)

Ademais, Boaventura postula dois tipos mais elevados de semiose pertinentes apenas às criaturas racionais, que são “imagens” (imago) apontando para o Primeiro Princípio por meio de seus poderes propriamente racionais que têm sua fonte e objeto mais elevado em Deus e “semelhanças” (similitudo) de Deus na medida em que são recipientes da graça divina e se conformam à vontade divina. Todas as criaturas, desde as rochas até os anjos, são sinais no sentido de sombras e traços de Deus, pois todas elas têm uma relação de dependência causal com Deus como sua fonte; mas somente as criaturas racionais podem ter o divino como objeto de suas atividades e, por essa razão, podem se conformar à vontade divina e se tornar semelhantes a Deus.

3.1 O Mundo Físico

A compreensão de Boaventura sobre o mundo físico tem uma grande dívida com duas fontes fundamentais: o relato bíblico da criação, mediado por comentários patrísticos, e a visão aristotélica da natureza, extraída principalmente dos escritos de Aristóteles sobre filosofia natural, como a Física (Physica) e Sobre os Céus (De caelo), mas combinada com os comentários de Averróis, os tratados de Avicena e o Timeu de Platão na tradução latina de Calcídio. Boaventura constrói uma visão do mundo físico que é devedora de ambas as fontes fundamentais, mas acaba dando precedência ao texto bíblico e à tradição patrística relacionada sempre que suas fontes entram em conflito. Sua maneira de sintetizar essas fontes em um todo coerente e impressionante é o que dá às suas perspectivas sobre a natureza seu caráter distintivo.

3.2 Criação

A tensão entre o corpus aristotélico recém-traduzido e o ensino teológico tradicional da Igreja com relação à doutrina da criação era bem compreendida na época de Boaventura. De fato, as proibições de 1215 e 1231 relativas ao ensino dos escritos aristotélicos sobre filosofia natural haviam dado lugar ao ensino direto de Aristóteles na Faculdade de Artes na época em que Boaventura fez seu mestrado em artes na Universidade de Paris e, quando ele deixou a Universidade, o corpus aristotélico em sua totalidade era um assunto de exame para candidatos a diplomas na Faculdade de Artes. No entanto, a doutrina aristotélica da eternidade do mundo recebeu várias interpretações. Alguns defendiam uma interpretação benigna, afirmando que tudo o que Aristóteles queria dizer na Física VIII era que o mundo e seu movimento não surgiram de algum movimento anterior, mas que o tempo, as coisas móveis e o movimento eram todos coevos e concomitantes. Outros, no entanto, o principal deles, Robert Grosseteste, argumentou que os pontos de vista de Aristóteles deveriam ser considerados pelo seu valor nominal e que aquilo que o estagirita pretendia era a eternidade do passado; os Padres gregos e os próprios comentaristas de Aristóteles estavam de acordo com o fato de que a perspectiva aristotélica envolvia a ausência de início do passado e a matéria não-originada.

A opinião de Boaventura tem sua origem em uma combinação de elementos vindos de Alexandre de Hales e Grosseteste. Seguindo o exemplo do último, Boaventura rejeita, embora com alguma hesitação, a leitura benigna do Estagirita; com toda a probabilidade, Aristóteles pretendia de fato ensinar que o mundo não tinha começo:

E essa opinião [isto é, que a matéria existiu eternamente sob alguma forma] parece mais razoável do que seu oposto, ou seja, que a matéria existiu eternamente incompleta, desprovida de forma e de influência divina, tal como alguns dos filósofos postulavam. De fato, essa perspectiva parece tão razoável que o mais excelente dos filósofos, Aristóteles, caiu nesse erro, pelo menos conforme os santos o imputam a ele, seus comentaristas o expõem e suas próprias palavras indicam. (In II Sent., lib. II, d. 1, pars 1, art. 1, qu. 2, resp. 1, qu. 2, resp. [Quaracchi II: 22b], trans. autores[16])

No entanto, a característica mais marcante do relato de Boaventura sobre os filósofos é a maneira pela qual ele justapõe a doutrina da criação, tal como ele a entende, com a teoria filosófica das origens. De acordo com Boaventura, apenas duas teorias a respeito da origem do cosmos são realmente defensáveis: primeiro, a teoria dos filósofos pagãos, segundo a qual o mundo é eterno e a matéria do universo não tem origem causal última; segundo, a doutrina cristã da criação, segundo a qual o universo depende inteiramente de Deus para existir, é produzido “do nada (ex nihilo)” e é temporalmente finito no passado. A terceira possibilidade, a saber, que o mundo é produzido a partir do nada e é eterno, Boaventura rejeita veementemente com base no fato de que tal postura é inerentemente contraditória:

Resposta: Postular que o mundo é eterno ou eternamente produzido, ao mesmo tempo em que se postula que todas as coisas foram produzidas do nada, é totalmente oposto à verdade e à razão, assim como a última razão apresentada mostrou. De fato, é tão oposto à razão que não acredito que nenhum filósofo, por menor que seja sua capacidade intelectual, tenha assumido essa posição. Pois isso envolve, por si só, uma contradição óbvia. Postular, entretanto, que o mundo é eterno com base na suposição de que a matéria é eterna parece razoável e compreensível…. (In II Sent., d. 1, pars 1, art. 1, qu. 2 [Quarac. 1, qu. 2 [Quaracchi II: 22a-b], trans. autores[17])

Voltando ao último argumento, encontramos o raciocínio ao qual Boaventura se refere. O argumento é uma síntese elegante e uma reafirmação da posição dos teólogos parisienses desde a época de Guilherme de Auxerre, mas é especialmente devedor das Quaestiones de Alexandre de Hales. Tudo o que depende inteiramente de outra coisa para existir é produzido por essa coisa a partir do nada. O mundo depende inteiramente de Deus para existir. Portanto, o mundo deve ter sido produzido a partir do nada. Se o mundo é produzido a partir do nada, ele deve surgir do “nada” enquanto saído da matéria ou do “nada” enquanto saído de um ponto de origem. O mundo não pode surgir do nada enquanto saído da matéria. Portanto, o mundo deve surgir do nada enquanto saído de um ponto de origem. Se, no entanto, o mundo surge do nada como de um ponto de origem, então o mundo tem o ser posterior ao não-ser. Nada que tenha um ser posterior ao não-ser pode ser eterno. O mundo, como uma coisa criada, tem o ser posterior ao não-ser. Portanto, o mundo, precisamente como criado “a partir do nada”, não pode ser eterno (In II Sent., d. 1, pars 1, art. 1, qu. 2 [Quaracchi II: 22a][18]). A força filosófica da expressão é que existe um momento lógico no qual poderíamos dizer que o mundo não é e com referência ao qual o mundo começa a ser. A referência ontológica de tal momento lógico é a eternidade divina com relação à qual (“após” a qual) o mundo começa.

Na mente de Boaventura, a visão criacionista do universo é a única que explica o ser total do universo no sentido de explicar tanto sua estrutura quanto o fato de que ele existe; a opinião dos antigos explica apenas a ordem e o padrão do universo, sem atingir a profundidade de explicar por que o universo existe. Um sinal dessa deficiência pode ser visto na pressuposição compartilhada por Platão e Aristóteles de que a matéria não tem origem. Ademais, na medida em que as antigas perspectivas pagãs do universo envolvem a infinidade do tempo passado, com todas as dificuldades filosóficas que a eternidade do tempo passado acarreta, a razão natural parece capaz de chegar, em princípio, à conclusão de que o mundo foi criado, embora, historicamente falando, o maior dos antigos filósofos não tenha conseguido fazê-lo.

3.3 Matéria

O conflito entre as fontes das Escrituras e os escritos aristotélicos sobre a questão do estado primordial da matéria não é tão grave, porque no corpus aristotélico não há descrição do estado primordial da matéria, e as outras fontes disponíveis para Boaventura estão em desacordo. Agostinho, por exemplo, sugeriu em seu comentário literal sobre Gênesis que a matéria do mundo poderia ter sido feita de uma só vez, enquanto em suas Confissões (Confessiones) ele sugeriu que poderia haver um estado inicial indeterminado e incipiente da matéria. Essa possibilidade foi ainda mais corroborada por autores pagãos como Platão e Ovídio, que postularam um estado caótico primordial da matéria do qual a ordem cósmica atual emergiu gradualmente (Platão, Timeu 52D-53C, 54-55; Ovídio, Metamorfoses, 43:5-45:7).

Boaventura começa distinguindo a consideração da matéria da existência atual da matéria na ordem da história natural (In II Sent., d. 12, art. 1, q. 1 [Quaracchi II: 294a]). Podemos considerar a matéria simplesmente como um princípio constitutivo das coisas e, como tal, é pura potência; essa é a maneira pela qual o conceito de matéria funciona na Física de Aristóteles e, na mente de Boaventura, a maneira pela qual Agostinho falou da matéria nas Confissões. No entanto, também podemos pensar na matéria como ela de fato existe no tempo. A esse respeito, a matéria nunca existe e não pode existir como desprovida de toda forma. Tal afirmação, no entanto, não exige que a criação material tenha surgido totalmente formada, mesmo que tal posição possa ser mais defensável filosoficamente do que seu oposto (In II Sent., d. 12, art. 1, q.2 [Quaracchi II: 296b]). Em vez disso, Boaventura sugere que a matéria física foi criada em um estado em que tinha a tendência e a capacidade de admitir muitas formas diferentes, embora não tivesse nenhuma delas em seu próprio direito. Em vez disso, sua potencialidade para desenvolver formas distintas exigia uma agência divina externa adicional para que as coisas distintas com formas diversas surgissem completamente (In II Sent., d. 12, art. 1, q.3 [Quaracchi II: 299b-300a]). As propriedades da matéria física em seu estado incompleto incluíam extensão e visibilidade (propriedades decorrentes da forma comum a todas as coisas físicas, a saber, a luz). Essas características ainda são compartilhadas por todos os itens do mundo físico, embora Boaventura admita, de acordo com o ensinamento aristotélico sobre os céus, que os corpos celestiais, como as estrelas, têm matéria que difere em espécie daquela das coisas terrestres. Assim, depois que as coisas foram totalmente produzidas, a matéria era dupla, terrestre e celestial, mas em seu estado primordial a matéria física desfrutava de uma unidade correspondente que era de contiguidade, ou seja, era uma massa única (In II Sent., d. 12, art. 2, q.1 [Quaracchi II: 303a-b])5. Essa unidade primordial da matéria física continua a ter alguma importância científica para Boaventura, pois fundamenta a consideração do físico geral que pode prescindir do processo de geração e corrupção e considerar os corpos simplesmente em termos de sua mobilidade no lugar e extensão (In II Sent., d. 3, p. 1 art. 1, q.2 [Quaracchi II: 97a]).

3.4 A Luz

O tratamento de Boaventura sobre a luz é encontrado principalmente na discussão sobre a luz em seu comentário sobre as Sentenças de Lombardo, Livro 2, d. 13. Nesse contexto teológico, a luz está relacionada principalmente ao trabalho dos seis dias da criação, e Boaventura deve tomar uma posição sobre o relato de Gênesis da criação da luz. Embora reconheça a interpretação espiritualizada de Agostinho sobre a luz, uma interpretação que identifica a luz mencionada em Gênesis com a criação e as atividades dos anjos, Boaventura se inclina a uma interpretação mais literal (In II Sent. d. 13, art. 1, q. 1 [Quaracchi II: 312b-313a]). Isso significa que Boaventura teve que assumir uma posição nos debates contemporâneos sobre a luz e sua natureza.

As duas posições que Boaventura discute são o que podemos chamar de uma posição amplamente aristotélica, que acabou sendo adotada por Tomás de Aquino, e uma posição amplamente agostiniana defendida por Robert Grosseteste em seu Sobre a luz (De luce). De acordo com a primeira, a luz é simplesmente uma forma acidental, encontrada em graus em diferentes corpos, mas, de acordo com a segunda, a luz talvez seja uma substância ou, pelo menos, uma forma substancial que comunica extensão e visibilidade às coisas físicas.

Boaventura descarta a possibilidade de que a luz seja uma substância, porque ela é puramente ativa e, se fosse uma substância em seu próprio direito, seria Deus e não uma criatura. No entanto, ele admite que a luz é uma forma substancial e é a forma substancial que é concomitante com a massa de matéria em seu estado primordial (In II Sent. d. 13, art. 2, q. 2 [Quaracchi II: 320b-321b]). Nessa condição originária, a luz deu à massa da matéria sua extensão e visibilidade, e a hierarquia dos corpos celestes corresponde à hierarquia das coisas capazes de participar mais ou menos da luz que torna os corpos ativos e estendidos. Para Boaventura, portanto, a luz é uma forma substancial, mas apenas a perfeição parcial no que diz respeito a qualquer substância física, seja ela celeste ou terrestre. Como Boaventura endossa, geralmente sem qualquer argumentação elaborada, a alegação geral de que há uma pluralidade de formas substanciais em qualquer coisa composta, sua doutrina da luz significa de fato que a luz é a primeira forma, dotando cada coisa de extensão e preparando o caminho para outras perfeições, como as formas dos elementos ou as formas de misturas ou compostos.

3.5 Razões Seminais

A transição na ordem da história natural de corpos que são simplesmente tais, estendidos e dotados da capacidade de agir e sofrer ação, para os corpos de plantas e animais é explicada em parte pelos movimentos dos corpos celestes e suas influências causais sobre a matéria. Em parte, entretanto, a própria matéria tem estruturas latentes que simplesmente aguardam as circunstâncias e condições corretas para causar o surgimento de um tipo superior de corpo. A essas estruturas latentes, originalmente semeadas na matéria em sua criação, Boaventura chama, seguindo a terminologia de Santo Agostinho, de rationes seminales ou razões seminais, um termo que remete à cosmologia dos antigos estóicos. As razões seminais equivalem a um impacto persistente do criador sobre a matéria do mundo físico, uma vez que sua presença na matéria se origina com a criação. Na ciência física, Boaventura acredita que as razões seminais ajudam a explicar o surgimento sucessivo de diferentes tipos de corpos adequados para tipos de vida cada vez mais elevados. Mas esse processo de surgimento gradual não se aplica à criação da vida humana, uma vez que, para Boaventura, as almas humanas são incorruptíveis e só podem surgir por meio da ação direta do criador.

Embora, a partir de nossa perspectiva pós-darwinista, possamos ser tentados a ver na doutrina das razões seminais, seja em Agostinho ou Boaventura, uma antecipação curiosa, ainda que incômoda, da doutrina da evolução, as semelhanças entre a doutrina das razões seminais e certos elementos da teoria evolutiva são mais aparentes do que reais. Em primeiro lugar, embora as razões seminais forneçam direcionalidade e progressão para a sucessão de tipos físicos na história natural, elas são formas latentes dentro da matéria e não são redutíveis a processos mecânicos ou químicos mais fundamentais; ao contrário, elas são subjacentes a esses processos. Em segundo lugar, nunca se recorre a razões seminais para explicar o desaparecimento de uma espécie viva e o surgimento de outra espécie para substituí-la, uma característica fundamental das explicações darwinistas. Em terceiro lugar, as razões seminais não são, como acabamos de ver, universais em sua aplicação aos seres vivos que ocorrem dentro da ordem da história natural; os seres humanos, pelo menos em termos de suas almas, estão fora da faixa de influência das razões seminais.

3.6 Coisas Vivas

As doutrinas de Boaventura com relação aos seres vivos são inspiradas principalmente em uma biologia aristotélica. Os seres vivos são assim graças ao tipo de forma que possuem, ou seja, a alma, que é definida como a primeira realidade de um corpo com potencial de vida. A alma é entendida como a forma que torna uma coisa viva e capaz de desfrutar o tipo de vida que ela tem. Consequentemente, as almas são denominadas vegetativas, sensitivas ou racionais, de acordo com as funções que os próprios seres vivos exercem.

3.7 Cognição Sensorial

O mundo, tal como nos é revelado por meio dos sentidos, fornece os meios para que nos reintegremos a nós mesmos e ascendamos a coisas mais elevadas. Ademais, os próprios sentidos são igualmente sinais de coisas mais elevadas.

As coisas físicas consideradas em seu próprio direito evidenciam “peso, número e medida” (Salmo 83:8), fazendo com que contemplemos sua própria medida, beleza e ordem. Essas características estão fundamentadas nas atividades e nos poderes naturais das substâncias sensíveis. A natureza das substâncias sensíveis, portanto, expressa em suas ações e interações a medida, a beleza e a ordem de sua origem e, assim, atesta o poder, a sabedoria e a bondade da Fonte da qual elas brotam (Itinerário cap. I, n. 11 [Quaracchi V: 298b]). Da mesma maneira, a origem, o tamanho, o número, a beleza, a plenitude, a função e a origem das coisas físicas apontam para a Fonte Divina e suas propriedades essenciais de poder, sabedoria e bondade (Itinerário cap. I, n. 14 [Quaracchi V: 299a-b]).

O fato de as coisas físicas apontarem para sua Fonte encontra seu paralelo na própria cognição sensorial, que também aponta para essa mesma Fonte. Partindo do tema neoplatônico de macrocosmo e microcosmo, Boaventura descobre uma analogia entre a cosmologia aristotélica e o processo da sensação. Cada objeto sensível gera uma semelhança de si mesmo no meio pelo qual é percebido, e essa semelhança, por sua vez, gera outra semelhança sucessivamente no órgão dos sentidos, fazendo com que o poder dos sentidos apreenda o objeto sensível. O processo assim descrito reflete o processo de emanação de formas dos corpos celestes e também a maneira pela qual as criaturas, saindo de seu Princípio, retornam à sua Fonte por meio do exercício de suas atividades naturais. Um padrão semelhante surge dentro dos diferentes atos exercidos por cada poder dos sentidos: o sentido apreende (apprehensio) o objeto, deleita-se (delectatio) com seu objeto, desde que o objeto não exceda os limites naturais do órgão, e julga (diiudicatio) ou discrimina a qualidade de seu objeto. Esse último ato, encontrado tanto nos sentidos externos quanto nos sentidos internos, assume um papel especial para Boaventura. Tal julgamento sensorial, por meio da consciência comparativa, separa o objeto de um determinado lugar e tempo, preparando assim o caminho dentro do domínio da cognição sensorial para a cognição intelectual (Itinerário cap. II, n. 6 [Quaracchi V: 301a]).

4. Criaturas Intelectuais

Quando chegamos ao limiar da cognição intelectual, estamos entrando na próxima etapa do itinerário de Boaventura. Esse nível de ser da criatura aponta para a Fonte Divina, mas de maneiras mais diretas do que aquelas em que as criaturas sensíveis o fazem. Ao exercerem seus poderes de intelecto e vontade, as criaturas intelectuais descobrem o objeto mais elevado e mais perfeito de seus poderes na Fonte Divina de seu ser, uma vez que Deus é a Primeira ou Mais Elevada Verdade e o Primeiro ou Principal Bem. Assim, as criaturas intelectuais têm Deus como seu objeto último, enquanto todas as criaturas têm Deus como sua Causa. Consequentemente, as criaturas intelectuais se mostram como “imagens” e “semelhanças” de Deus, enquanto mostram que todas as criaturas são “sombras” e “vestígios” de Deus.

Boaventura descreve como as criaturas intelectuais e os objetos inteligíveis refletem a Fonte divina. Se começarmos com algo tão imediato e básico como a simples apreensão por parte do intelecto humano, descobriremos que um objeto de simples apreensão (como o tipo natural “cachorro”) é suscetível de definição. No entanto, toda definição requer um gênero e uma diferença. Por meio do termo genérico, somos levados a um objeto adicional de simples apreensão, geralmente suscetível de definição. Se o gênero for definível, podemos declarar sua definição, mas acabaremos por nos encontrar, por meio da continuação do processo de definição, chegando de forma semelhante a uma das categorias gerais supremas ou aristotélicas; se o gênero não for definível, então chegamos a uma das categorias aristotélicas. Quando chegamos a uma categoria, nos deparamos com um item que não é passível de definição adicional, embora admita descrição. Se o item categórico for um acidente, ele satisfaz a descrição de um acidente como “ser por meio de outro”; se estivermos lidando com substância, então o item que estamos considerando satisfaz a descrição de substância como “ser em si mesmo”.

A resolução de todos os nossos itens de simples apreensão pelo conceito de ser é metafísica e epistemologicamente crucial: metafisicamente, ela abre uma rota de argumentação que leva à existência de Deus; epistemologicamente, essa resolução significa que, por trás de todas as concepções de coisas, mesmo as mais determinadas e específicas, está uma consciência transcendental do ser que informa todo o nosso conhecimento. Se considerarmos o conceito de substância como sendo em si mesmo, não podemos conhecer a definição de uma substância específica sem o conceito de ser pressuposto em segundo plano e, além disso, estamos concomitantemente cientes das propriedades transcendentais do ser (unidade, verdade e bondade) em qualquer noção desse tipo. Essas propriedades transcendentais co-extensivas, no entanto, são apenas um dos dois tipos de propriedades que pertencem ao ser; as outras propriedades transcendentais (mais tarde chamadas de propriedades disjuntivas) são extremamente úteis para aumentar nosso conhecimento metafísico. O ser pode ser concebido como atual ou potencial, absoluto ou dependente, anterior ou posterior, imutável ou mutável. No entanto, para conceber o ser como potencial, dependente, posterior ou mutável, é necessário que já estejamos familiarizados com o ser como atual, independente, anterior e imutável. Em outras palavras, o mais perfeito dos dois disjuntos em qualquer um dos transcendentais disjuntivos deve ser um item que reconhecemos em nossa consciência do ser:

Uma vez que as privações e os defeitos só podem ser conhecidos por meio de características positivas, nosso intelecto não resolve totalmente a compreensão de qualquer coisa criada, a menos que seja auxiliado por uma compreensão do ser mais puro, atual, completo e absoluto, que é o ser simples e eterno e no qual se encontram todas as fórmulas das coisas em sua pureza. De fato, como a mente pode saber que esse ser é defeituoso e incompleto a menos que tenha alguma consciência de ser sem defeito? E a mesma linha de análise se aplica às outras condições do ser mencionadas acima. (Itinerário cap. III, n. 3 [Quaracchi V: 394a]; trans. autores)[20]

Em um nível, essa linha de argumentação é parte de um argumento para a existência de Deus. Porém, em outro nível, é um esforço para demarcar o objeto próprio da mente humana como ser e para apontar que, se refletirmos sobre a noção de ser (ens) em termos de sua atualidade (esse), seremos inexoravelmente levados à conclusão de que existe um Ser Perfeito (Itinerário cap. V, n. 3 [Quaracchi V: 308b-309a][21]). Chegamos ao mesmo tipo de conclusão se refletirmos, não sobre o objeto primário da mente, mas sobre suas operações. A certeza do julgamento exige que estejamos cientes da impossibilidade de estarmos errados, combinada com a consciência de que a verdade que conhecemos não pode ser diferente; de fato, as verdades mais fundamentais que conhecemos são todas imutáveis. Porém, seguindo Agostinho, Boaventura afirma que não há outra fonte para a verdade imutável além de Deus, uma vez que Deus é o único Ser imutável e inalterável. III, n. 3 [Quaracchi V: 304a-b][22]).

O que descobrimos quando olhamos para dentro de nós mesmos é que estamos apontando para Deus, que é a luz da mente, garantindo a certeza de nossos julgamentos. Essa tese, geralmente chamada pelos estudiosos de iluminação divina, era bastante antiga na época de Boaventura; fazia parte do ensinamento filosófico de Agostinho. O que torna a versão de Boaventura tão distinta do ponto de vista filosófico é que ele propõe sintetizar a epistemologia da iluminação divina com o relato aristotélico da abstração. Boaventura está totalmente comprometido com o papel integral desempenhado pelo agente e pelos intelectos possíveis na cognição intelectual humana. O agente e os intelectos possíveis não são substâncias separadas, da maneira prevista por Averróis, mas faculdades propriamente humanas essenciais para a constituição da alma humana (In II Sent. d. 24, pars 1, art 2, q. 4 [Quaracchi II: 568b][23]). Portanto, ao contrário de seus contemporâneos, que frequentemente pensavam no intelecto humano possível como sendo iluminado por Deus, funcionando como um intelecto agente, Boaventura atribui a cada ser humano um intelecto agente. Diferentemente de seus contemporâneos, Boaventura também insiste que o intelecto possível sempre permanece o receptor das espécies inteligíveis abstraídas pelo intelecto agente e pela faculdade da apreensão; consequentemente, o intelecto possível continua a fazer parte da alma humana mesmo quando a alma é separada do corpo pela morte (In II Sent. d. 24, pars 1 art. 2, q. 4 [Quaracchi II: 569b-570a]). A abstração é, para Boaventura, a principal, embora não exclusiva, fonte de nossos conceitos das coisas. Como, então, funciona a iluminação e por que ela é necessária? A luz divina trabalha em conjunto com as faculdades intelectuais humanas como uma “causa regulativa e móvel”, assegurando que a mente humana compreenda a verdade imutável da criatura; ela não substitui e não pode substituir as faculdades intelectuais humanas em seus devidos papéis (De scientia Christi, q. 4 [Quaracchi V: 23b]). O apelo à iluminação divina é justificado, principalmente, se não exclusivamente, pela razão de que há uma incomensurabilidade entre nossas faculdades intelectuais e os objetos comuns que conhecemos como criados e mutáveis, por um lado, e as verdades imutáveis que passamos a conhecer, por outro. Uma vez que as coisas não podem dar o que não têm, a única fonte de verdade eterna e imutável é a Luz de Deus.

Em geral, as atividades próprias das criaturas intelectuais apontam muito mais diretamente para a Fonte divina do que as criaturas meramente sensíveis ou sencientes. Tanto os objetos do entendimento quanto os da vontade estão, em última análise, enraizados em Deus como Ser e Bondade. Esse direcionamento mais direto a Deus por parte da criatura intelectual também é visto na constituição da criatura intelectual, tanto psicológica quanto ontológica. A imagem de Deus é encontrada na inter-relação fundamental da memória, do entendimento e da vontade. Cada ato de memória evoca o passado, está ciente do presente e antecipa o futuro; cada ato de compreensão pressupõe a memória dos primeiros princípios; e cada ato de vontade pressupõe o ato de compreensão e move a mente para outros atos de memória. Essa estrutura triádica da mente humana reflete sua Fonte: o Ser Perfeito que é, simultaneamente, a Mais Alta Unidade, a Verdade Suprema e o Bem Supremo (Itenerarium cap. III, n. 5-6 [Quaracchi V: 305a-b]). Da mesma maneira, a constituição ontológica das criaturas intelectuais, humanos e anjos, nos leva ao longo do caminho para a consideração de Deus. Cada criatura intelectual é composta de ato e potência, princípios metafísicos que Boaventura entende como sendo co-extensivos com matéria e forma (In II Sent. d. 3 pars 1, art. 1, q. 2 resp. [Quaracchi II 97b]). Por conseguinte, mesmo as criaturas intelectuais são compostas de forma e matéria (In II Sent., d. 3, pars 1, art. 1, q. 1 resp. 1, q. 1 resp. [Quaracchi II: 91a]; In II Sent. d. 17, art. 1, q. 2, resp. [Quaracchi II: 414b-415a]). Para Boaventura, é a conjunção de forma e matéria que explica a individualidade de cada coisa (In II Sent. d. 3, pars 1, art. 2, q. 3 resp. 2, q. 3 resp. [Quaracchi II: 109b-110a]; sobre o princípio da individuação em Boaventura, veja King 1994). Mas o fato de que mesmo as criaturas mais elevadas são compostas de potência e agem dessa maneira implica que elas são derivadas de uma Fonte que não é assim composta, mas é, em vez disso, puro ato e, portanto, pura forma.

5. Deus

Em suas Colações sobre o Hexameron, Boaventura leu o Gênesis espiritualmente, distinguindo sete níveis de “visão” correspondentes aos sete dias da criação. O primeiro nível é o “entendimento naturalmente dado” ou filosofia, que ele dividiu, seguindo os estóicos, em lógica, ética e física, a última subdividida, seguindo Aristóteles, em filosofia natural, matemática e metafísica. O foco da metafísica está nas relações causais entre Deus e as criaturas. Aqui

os filósofos – os melhores e os antigos filósofos — chegaram a esta conclusão: há um começo, um fim e uma causa exemplar

do universo (Collationes in Hexaëmeron 6.1 [Quaracchi V: 360]; trans. autores), ou seja, Deus é a causa eficiente, final e formal do mundo. Uma vez que a causalidade eficiente conecta a metafísica à física e a causalidade final a conecta à ética, o “verdadeiro metafísico” se concentra na causalidade exemplar (Collationes in Hexaëmeron 1.13 [Quaracchi V: 331]; cf. Speer 1997: 30-1), um tipo de causalidade formal que é o grande tema da metafísica bonaventuriana.

Para abordar esse tema, Boaventura fez uso de materiais extraídos de filósofos anteriores sobre três pontos importantes: os transcendentais, as três rotas neoplatônicas para Deus e a diferença entre princípios e conclusões científicas. Com relação aos transcendentais, Aristóteles fez da metafísica a ciência da substância. Séculos mais tarde, Avicena transformou-a em uma ciência verdadeiramente universal em seu escopo, insistindo que estudasse os nove acidentes, bem como a substância, e também os atributos que transcendem as categorias (Avicena, Metaphysica, 1.5, 8). Filipe, o Chanceler, codificou essa doutrina em quatro transcendentais — ser, um, verdadeiro e bom (Aertsen, 1996: 25-70). Boaventura inicia a consideração de Deus em seu Comentário sobre as Sentenças observando que os atributos categóricos do ser são “suas propriedades especiais que caracterizam sua imperfeição”, mas os transcendentais são “suas condições gerais que caracterizam sua perfeição” (In I Sent. d. 3, pars 1, art. 1, q. 2 ad 1 [In I Sent. d. 3, pars 1, art. 1, q. 2 ad 1]). 1, q. 2 ad 1 [Quaracchi I: 72a-b]; trans. Houser e Noone 2013, 75). Os transcendentais, portanto, estabelecem os termos para tratar de Deus.

Quando leu “os livros dos platonistas”, Agostinho abriu três vias para provar a existência de Deus, embora ele mesmo tenha explorado apenas uma. Argumentos como os de Aristóteles, que começam no mundo, devem prosseguir do efeito para a causa e foram chamados de argumentos cosmológicos, embora aitiológicos — que significam simplesmente um argumento que descobre causas — parecem ser uma descrição melhor. Quando Agostinho se voltou para dentro de sua mente, abriu duas outras vias para Deus. A segunda via também procede do efeito para a causa, mas começa dentro da mente e busca Deus como a causa última do conhecimento da mente. Esse é o argumento da iluminação de Deus. A volta de Agostinho para dentro de si também abriu uma terceira via, que mais tarde recebeu de Kant o infeliz nome de argumento ontológico. O desenvolvimento mais completo dessa abordagem neoplatônica de Deus estava pronto para ser realizado, quando todas as três vias, a aitiológica, a da iluminação e a ontológica, seriam exploradas por uma única e mesma mente filosófica. Essa mente não era a de Agostinho ou Anselmo, mas a de Boaventura.

Se os transcendentais vieram principalmente dos aristotélicos muçulmanos, especialmente Avicena, e as três vias para Deus foram abertas por Agostinho, o último conjunto de materiais que Boaventura usou para construir seus argumentos para a existência de Deus veio do próprio Aristóteles. A “ciência” consiste no conhecimento de um tema limitado obtido por meio da demonstração de conclusões sobre ele com base em princípios não demostrativos. Boaventura fazia parte de um grupo de teólogos parisienses, incluindo os dominicanos Alberto e Tomás, que tentaram estabelecer a teologia cristã como uma ciência aristotélica. Portanto, ele abordou a questão da existência de Deus com uma distinção nítida entre princípios e conclusões em mente. A pergunta que ele faz não é “Deus existe?”, mas “O ser divino é verdadeiro a ponto de não poder ser pensado como não sendo?” Essa formulação anselmiana oferece duas opções: A existência de Deus é um princípio ou uma conclusão demonstrada. Os filósofos tendem a escolher uma via de acesso a Deus e a rejeitar todas as outras, mas Boaventura aprendeu com Francisco, o pobre homem de Assis, que o mundo está repleto de sinais de Deus que até o mais simples camponês pode captar. A resposta de Boaventura ao problema da existência de Deus foi, portanto, muito incomum. Ele buscou todas as três vias para Deus e até mesmo as classificou: Os argumentos da iluminação nos dão “certeza” da existência de Deus; os argumentos aitiológicos nos dão um conhecimento “mais certo” da existência de Deus; enquanto os argumentos ontológicos mostram que a existência de Deus é

uma verdade que é mais certa em si mesma, na medida em que é a primeira e mais imediata verdade. (De mysterio trinitatis 1.1 concl. [Quaracchi V: 49; tr. Hayes 1979: 116])

Vamos dar uma olhada em cada uma delas.

5.1 O Argumento da Iluminação de Boaventura

O transcendental que inicialmente abre argumentos para a existência de Deus é a “verdade”. Boaventura baseia seu argumento da iluminação no sentido epistemológico da verdade, inspirado pela memorável descrição de Agostinho de sua própria via interior para Deus:

E admoestado por tudo isso a retornar a mim mesmo, entrei dentro de mim mesmo com você guiando e fui capaz de fazê-lo porque você se tornou meu ajudante. E entrei e, com o olho de minha alma, tal como era, vi acima do olho de minha alma, acima de minha mente, uma luz imutável…. Quem quer que conheça a verdade conhece essa luz…. Ó verdade eterna e amor verdadeiro e eternidade amada, tu és meu Deus; a ti suspiro noite e dia. (Agostinho, Confissões, 7.10 [CCSL 27: 103])

Em seu Comentário sobre as Sentenças, Boaventura extraiu da retórica agitada de Agostinho o núcleo lógico do argumento da iluminação, reduzindo-o a silogismos simples e desapaixonados, como havia aprendido com seus professores de Artes em Paris:

Todo entendimento correto prova e conclui a verdade do ser divino, porque o conhecimento da verdade divina está impresso em toda alma, e todo conhecimento surge por meio da verdade divina. Toda proposição afirmativa prova e conclui essa verdade. Pois toda proposição afirmativa postula algo. E quando algo é colocado, o verdadeiro é colocado; e quando o verdadeiro é colocado, aquela verdade que é a causa do verdadeiro também é colocada. (In I Sent. d. 8, pars 1, art. 1, q. 2, resp. 1, q. 2, resp. [Quaracchi I: 155a]; trans. Houser e Noone 2013, 108 [modificado])

Boaventura entendeu que o passo de uma proposição verdadeira para a verdade divina é grande, então ele defende uma posição iluminista moderada, que depende de causas divinas e criadas. A teoria da iluminação agostiniana de Boaventura evita os problemas do platonismo, que transforma o conhecimento do mundo em conhecimento de Deus, e os problemas do Iluminacionismo muçulmano, que pensava que uma criatura poderia fazer aquilo que a mente infinita de Deus necessita para realizar.

Para certo conhecimento, a razão eterna está necessariamente envolvida como uma causa regulativa e motriz, no entanto, não como a única causa ou em sua total clareza, mas junto com uma causa criada e como contuída por nós “em parte”, de acordo com nosso presente estado de vida. (De scientia Christi q. 4 concl. [Quaracchi V: 23]; trans. Hayes 1992, 134 [modificado])

Para explicar a contribuição das causas “criadas” do conhecimento, Boaventura observou que o conteúdo do conhecimento humano vem de quatro tipos de causas “criadas”: o intelecto passivo dentro da alma individual como causa material, pois recebe o conhecimento; o intelecto agente individual como causa eficiente, pois abstrai o conteúdo do conhecimento da sensação; a essência de uma criatura individual conhecida como causa formal, pois a criatura é “o que” conhecemos; e a verdade epistemológica como fim. Esses “princípios próprios” do conhecimento não envolvem Deus (In II Sent. d. 24, pars 1, art. 2, q. 4 [Quarac. 2, q. 4 [Quaracchi II: 567-571]; cf. J. Quinn 1973: 345-352).

Acima e além dessas causas “criadas”, o conhecimento também exige uma causa “eterna”. Nos atos mentais de abstração de universais e de argumentação indutiva, a mente humana generaliza para muito além dos dados de nossa experiência. Uma coisa é ser capaz de generalizar, outra bem diferente é ter certeza de que se conseguiu. A intuição sobre a essência de uma criatura envolve verdades que não são apenas universais, mas também necessárias e certas. Deus conhece toda a extensão de qualquer universal, pois a idéia divina de qualquer verdade consiste no conhecimento dessa verdade em absolutamente todas as suas instanciações atuais e possíveis. A extensão infinita do conhecimento de Deus é o que torna certo o entendimento divino, e essa certeza na mente divina é emprestada, por assim dizer, à mente humana.

Se o conhecimento pleno requer o recurso a uma verdade que é totalmente imutável e estável, e a uma luz que é completamente infalível, é necessário para esse tipo de conhecimento recorrer à arte celestial quanto à luz e à verdade: uma luz, eu digo, que dá infalibilidade ao conhecedor [criado], e uma verdade que dá imutabilidade ao objeto [criado] do conhecimento. (De scientia Christi q. 4, concl. [Quaracchi V: 23]; trans. Hayes 1992, 135 [modificado])

Aqui Boaventura torna mais precisas a “luz” e a “verdade” de Agostinho. Elas são os dois lados da certeza, de modo que é a certeza, e somente a certeza, encontrada no conhecimento humano que requer iluminação divina; todas as outras características do conhecimento humano — abstração, universalidade, correspondência — vêm de causas criadas.

5.2 O Argumento Aitiológico de Boaventura

O argumento aitiológico é “mais certo”, porque começa com um efeito real fora da mente e, portanto, se encaixa melhor no modelo de demonstração de Aristóteles. Mas Boaventura não segue o argumento de Aristóteles a partir do movimento, porque o movimento se enquadra nas categorias. Mais promissores eram os argumentos aitiológicos neoplatônicos (Boethius Consolatio philosophiae, III 10; Anselm Monologion, 1-3), que combinam uma premissa empírica com uma premissa de participação. Foi assim que Boaventura reuniu seu argumento aitiológico em um único silogismo:

Toda verdade e toda natureza criada provam e levam à existência da verdade divina. Porque, se existe ser por participação e a partir de outro, deve existir um ser que seja devido à sua própria essência e não a partir de outro. (In I Sent. d. 8, art. 1, q. 2, resp. 1, q. 2, resp. [Quaracchi I: 155a]; trans. Houser e Noone 2013, 108)

Para sua premissa empírica, Boaventura volta-se novamente para a verdade, mas a verdade ontológica. Todas as criaturas são verdadeiras na medida em que realizam as perfeições potenciais de suas naturezas, e são falsas na medida em que não o fazem, porque a verdade ontológica é “a indivisão de ato e potência”. Portanto, “em uma criatura há indivisão combinada com diferença entre ato e potência”. Todas as criaturas são atualizações parciais da verdade. A verdade ontológica nos leva ao coração da metafísica bonaventuriana. A definição de Aristóteles de matéria primordial como potência pura significa que tudo o que contém potência de qualquer tipo, até mesmo um anjo, deve conter matéria. Esse hilomorfismo universal leva, por sua vez, à doutrina do ser de Boaventura:

  1. A matéria dá a existência própria (existere) à forma, enquanto a forma dá o ato de ser (essendi actum) à matéria. Existere dat materia formae, sed essendi actum dat forma materiae (In II Sent. d. 3, pars 1, art. 2, q. 3 concl. 2, q. 3 concl. [Quaracchi II: 110]; trans. autores)

Todo ser criado (ens) é um composto ontológico de existência autônoma (existere) e ser (esse), onde esse significa a natureza ou essência da coisa. Das rochas aos anjos, todas as criaturas são verdadeiras na medida em que as potências de sua “existência” dadas pela matéria são realizadas por meio da perfeição de seu “ser” por meio da forma.

A premissa da participação vai do efeito à causa dentro da linha da causalidade formal. Uma condição necessária para a existência de qualquer atributo por participação é o fato de o mesmo atributo estar presente em seu exemplar essencialmente, ou seja, intrinsecamente. A participação não nos leva imediatamente a Deus, mas inicialmente descreve as relações entre as criaturas. Uma estátua ou um computador pode ter certos atributos humanos — forma, cor, tamanho, habilidade computacional — mas somente porque essas características são causadas pelo artesão que o criou. É assim que a participação funciona dentro da ordem criada. É a “verdade” transcendental que leva o argumento para além das criaturas e até Deus. Se a realização incompleta de um atributo categórico intrinsecamente imperfeito — como branco, cavalo ou sujeira — implica que esses atributos também devem existir em alguma outra criatura “essencialmente”, então os atributos transcendentais devem se comportar da mesma maneira. Porém, nenhuma criatura poderia ser esse exemplo. O exemplo da verdade ontológica deve, portanto, ser Deus, que realiza perfeitamente sua própria essência, o que significa dizer que Deus é verdadeiro “essencialmente”. Em Sobre o Mistério da Trindade, Boaventura expande essa linha de argumentação ainda mais na direção dos transcendentais. Lá ele identifica mais nove transcendentais disjuntivos, além do par “por participação” e “essencialmente”, onde o menor implica a existência do maior (De mysterio trinitatis 1.1 arg. 11-20 [Quaracchi V: 46b-47b])6.

Assim como seu argumento da iluminação revelou Deus como um tipo de causa formal e eficiente da certeza, o argumento aitiológico de Boaventura revela Deus como causa formal da verdade nas criaturas. No entanto, além disso, ele termina exatamente onde começa seu argumento ontológico. Pois o que faz um argumento ontológico senão perscrutar a lógica interna de tal essência exemplar e tentar capturar a consequência lógica de que ela deve existir?

5.3 O Argumento Ontológico de Boaventura

Boaventura foi o primeiro pensador do século XIII a dar atenção séria ao argumento ontológico. Ele leu o Proslogion de Anselmo através das lentes aristotélicas. Aristóteles havia reconhecido três tipos diferentes de princípios científicos: axiomas comuns que governam todo o pensamento, que são conhecidos de tal modo que ninguém pode negá-los, e princípios próprios limitados em seu alcance a uma determinada ciência — suas definições e postulados. Anselmo parecia querer dizer que a existência de Deus é um axioma do pensamento conhecido por todos os seres humanos, e Boaventura concorda:

Uma vez que nosso intelecto nunca é deficiente no que diz respeito ao conhecimento de Deus, se ele o é, então é impossível ignorar a existência de Deus, absolutamente falando, nem mesmo pensar que Deus não existe. (In I Sent. d. 8, a. 1, q. 2 concl. [Quaracchi I: 154b]; trans. Houser e Noone 2013, 107)

Enquanto Anselmo pensava que essa conclusão exclui até mesmo a possibilidade de ateísmo, Boaventura mostra de modo mais realista como o ateísmo é possível. O problema está em nosso conhecimento defeituoso acerca da natureza de Deus. O erro nesse ponto pode levar, por inferência lógica, à conclusão de que Deus não existe de fato. Somos espontaneamente teístas, mas podemos nos convencer a nos tornarmos ateus. A definição inadequada sobre Deus aponta para um segundo problema. Saber que Deus existe é semelhante a conhecer axiomas, pois ambos são reconhecidos por todos. A diferença é que temos certeza de que “o todo é maior do que a parte”, porque os termos envolvidos nesse axioma nos são demasiado familiares; mas sobre a existência de Deus temos mais uma opinião do que um conhecimento certo, porque nos falta uma definição adequada da natureza de Deus.

Há dois remédios para os defeitos em nosso conhecimento sobre “o que” Deus é, um tirado da fé, o outro da razão. Ambos tornam o conhecimento da existência de Deus mais como um postulado conhecido com certeza pelos “sábios” do que como um axioma reconhecido por “todos” os seres humanos (Boécio, De hebdomadibus, 40). Para a crença cristã e para a teologia, a existência de Deus é um artigo de fé. O outro remédio é a adaptação feita por Boaventura do argumento de Anselmo, concebido como um argumento filosófico em nome de um postulado metafísico.

O argumento ontológico de Boaventura contém dois momentos, por assim dizer, um negativo e outro positivo. Negativamente, o argumento ontológico de Boaventura procede como uma redução ao absurdo da proposição ateísta. Anselmo havia tomado uma descrição peculiar de Deus, “algo que não pode ser pensado como maior”, a qual Agostinho havia usado para argumentar, por meio de uma reductio ad absurdum, até a conclusão de que Deus deve ser incorruptível, e que Boécio usou para argumentar que Deus deve ser bom, e ele a usou para argumentar, por reductio, que Deus deve existir em primeiro lugar. Boaventura reconheceu a afinidade com a argumentação por reductio em apoio ao princípio da não-contradição:

Assim como uma união de coisas que estejam no mais alto grau distantes uma da outra é inteiramente repugnante ao nosso intelecto, porque nenhum intelecto pode pensar que uma coisa ao mesmo tempo é e não é, assim também a divisão de algo inteiramente uno e indivisível é inteiramente repugnante a esse mesmo intelecto. Por essa razão, assim como é evidentemente falso dizer que a mesma coisa é e não é, também é evidentemente falso dizer, ao mesmo tempo, que a mesma coisa é em grau máximo e que de modo algum o é. (De mysterio trinitatis. 1.1, concl. [Quaracchi V: 49]; trans. Hayes 1979, 116 [modificado])

Mas seu estudo da filosofia aristotélica tornou Boaventura mais sensível do que Anselmo às limitações dos argumentos de reductio. A percepção positiva dos princípios é maior do que a reductio negativa que leva aos princípios, de modo que prender o ateu em uma contradição ainda é um passo para a afirmação de que Deus existe. Para tornar esse passo inteligível, ele emendou o argumento ontológico em uma direção positiva.

Portanto, Boaventura explica o que torna uma proposição “auto-evidente”, o que, por sua vez, abre o caminho para deduzir a existência de Deus a partir da essência de Deus.

Os princípios são “evidentes por si mesmos” (cf. Aristóteles, Tópicos, 100a31-b21). No segundo dos modos de per se de Aristóteles (Aristóteles, Analíticos Posteriores, 73a34-b3), a essência do sujeito causa o predicado. Isso proporcionou a Boaventura uma explicação engenhosa do motivo pelo qual os princípios são evidentes por si mesmos:

Conhecemos os princípios na medida em que entendemos os termos que os compõem, porque a causa do predicado está incluída no sujeito.

Se a essência do termo sujeito é o que o conecta ao termo predicado em uma proposição auto-evidente, então a essência de Deus deve ser o que torna “Deus existe” auto-evidente. O argumento ontológico positivo contém uma inferência à existência de Deus que passa pela essência divina.

A maioria das descrições da essência divina é inadequada para o argumento ontológico, mas os transcendentais são os termos certos porque não implicam imperfeição, podem ser predicados não-metaforicamente de Deus e são primordiais, as “primeiras noções que vêm à mente” (Itinerário 3.3 [Quaracchi V: 304a]; cf. Avicena, Metaphysica 1.5). Todos os conceitos mais específicos pressupõem noções transcendentais, e a própria fórmula de Anselmo não foi exceção a essa regra. Em seu Comentário sobre as Sentenças, Boaventura usou o transcendental “verdadeiro” como o termo médio de seu argumento ontológico positivo; na questão disputada Sobre o Mistério da Trindade, ele usou “bom”, e no Itinerário da Mente para Deus, ele usou “ser”.

No Comentário, Boaventura apresenta seus argumentos para a existência de Deus com um tratamento elaborado da verdade. Como uma relação, a verdade sempre envolve uma comparação. A verdade epistemológica é uma “indivisão” entre a mente humana e a coisa conhecida. A verdade ontológica é uma “indivisão” entre a potência e o ato dentro de uma criatura; quanto mais ela cumpre sua natureza, mais verdadeira ela é. Esses dois sentidos de verdade abrem uma comparação da criatura como participante com Deus como exemplo. Todas as três verdades, epistemológica, ontológica e participacionista, são imperfeitas, combinações de verdade e falsidade. Elas apontam para seu exemplar, a única verdade “pura”, presente somente em Deus, onde há “pura indivisão misturada com nenhuma diversidade” (In I Sent. d. 8, art. 1, q. 1 concl. [Quaracchi I: 151b]). Esse último sentido de verdade é usado por Boaventura em seu argumento ontológico:

Conhecemos os princípios na medida em que entendemos os termos que os compõem, porque a causa do predicado está incluída no sujeito. É por isso que os princípios são evidentes por si mesmos. A mesma coisa é verdadeira com relação a Deus. Pois Deus, ou a verdade mais elevada, é o próprio ser, aquilo do qual nada mais grandioso pode ser pensado. Portanto, não se pode pensar que Deus não é, pois o predicado já está incluído no sujeito. (In I Sent. d. 8, art. 1, q. 2 concl. 1, q. 2 concl. [Quaracchi I: 155a; trans. Houser e Noone 2013, 108])

Boaventura inclui o raciocínio negativo que é tão proeminente na versão de Anselmo, mas à fórmula de Anselmo ele acrescenta “o próprio ser” e “a verdade mais elevada”. Embora cada uma dessas três descrições lance uma luz diferente sobre por que a inferência à existência de Deus é válida, Boaventura aqui parece preferir “a verdade mais elevada” porque a definição de verdade como “indivisão” é a base para reconceber o argumento ontológico enquanto estabelecimento de uma “indivisão” entre o termo médio e o predicado “existe”. Se a “verdade mais elevada” é “pura indivisão”, então a verdade mais elevada não pode ser separada da existência.

Em Sobre o Mistério da Trindade, Boaventura muda o foco do argumento ontológico para a bondade, com um resultado memorável. A noção básica de bondade não é, por si só, suficiente para montar um argumento ontológico, mas a análise da bondade revela os termos relevantes:

Ninguém pode ignorar o fato de que isto é verdade: o melhor é o melhor; ou pensar que isso é falso. Porém, o melhor é um ser que é absolutamente completo. Ora, qualquer ser que seja absolutamente completo, por essa mesma razão, é um ser atual. Portanto, se o melhor é o melhor, o melhor é. De maneira semelhante, pode-se argumentar: Se Deus é Deus, então Deus é. Ora, o antecedente é tão verdadeiro que não se pode pensar que ele não seja. Portanto, é verdade sem dúvida que Deus existe. (De mysterio trinitatis 1.1 fund. 29 [Quaracchi V: 48]; trans. autores)

A lógica do “melhor” (optimum) é diferente da lógica do “bom”. Como a bondade completa ou aperfeiçoa algo, “o melhor” deve ser “um ser que é totalmente completo (ens completissimum)”. Ora, o que é absolutamente completo deve possuir todas as perfeições possíveis. Todavia, a existência não é apenas uma perfeição, um componente entre muitos que compõem essa completude ontológica, ela é a característica mais fundamental dessa completude. Consequentemente, esse ser absolutamente perfeito deve existir. O argumento de Boaventura vai do sujeito “Deus”, passando pelos termos intermediários “o melhor” e “ser absolutamente completo”, até o predicado “existe”. Na formulação mais curta e ainda mais memorável, “Se Deus é Deus, Deus é”, a premissa Se Deus é Deus não é uma tautologia vazia (Seifert 1992: 216-217). Ela significa “se a entidade à qual o termo Deus se refere realmente possui a essência divina”. E a conclusão significa que tal entidade deve existir.

Boaventura estava bem ciente das críticas ao argumento ontológico, começando com a réplica de Gaunilo de que a maior de todas as ilhas possíveis também deveria existir de fato. Sua resposta é mais eficaz do que a de Anselmo porque usa os transcendentais. Uma ilha é um ser inerentemente imperfeito (ens defectivum) porque categórico; mas ens completissimum não é porque transcendental (De mysterio trinitatis 1.1 ad 6 [Quaracchi V: 50]).

No Itinerário da Mente para Deus, c. 5, Boaventura concentra o argumento ontológico no “ser” e o desenvolve para além de tudo o que havia feito anteriormente. Ele qualifica esse de duas maneiras diferentes, criando dois termos intermediários diferentes: “ser divino” (esse divinum) e “ser completamente puro (esse purissimum)”. Primeiro, ele usa o “ser completamente puro” para deduzir o predicado “existe” e, em seguida, usa “ser divino” para garantir que é Deus quem tem sua existência comprovada. Dessa maneira, as etapas básicas desse argumento são muito parecidas com as do argumento baseado na bondade:

Deus (Deus), que é o ser divino (esse divinum), também é visto como um ser completamente puro (esse purissimum) e, portanto, deve existir (est).

Boaventura começa (Itinerário 5.3 [Quaracchi V: 308]) repetindo os fundamentos das versões anteriores do argumento, mas depois vai bastante além deles:

Pois o próprio ser completamente puro ocorre apenas em plena fuga do não-ser, assim como o nada está em plena fuga do ser. Portanto, o nada completo não contém nada do ser ou de seus atributos, de modo que, em contrapartida, o próprio ser não contém o não-ser, nem em ato nem em potência, nem na realidade nem em nosso pensamento sobre ela. (Itinerário 5.3 [Quaracchi V: 308]; trans. autores[26])

Se “ser em si” (ipsum esse) distingue o ser (esse) de uma criatura e sua existência independente (existere), acrescentar o superlativo completamente puro ser em si (esse purissimum) refere-se à noção de uma essência que não envolve o não-ser de forma alguma: uma essência completamente pura ou perfeita. A noção de esse purissimum não pressupõe a existência real de Deus; ao contrário, ela implica essa existência real. Contudo, nesse ponto, essa inferência pode ainda não estar clara, de modo que Boaventura dedica o restante desse breve texto a mostrar por que a noção de ser em si completamente puro implica, de fato, a existência real de Deus.

Em contraste com as criaturas, que estão em um nível intermediário na escala do ser porque estão abertas à existência e à não-existência, as noções de completo nada (omnino nihil) e de ser completamente puro (esse purissimum) têm implicações absolutamente opostas para a existência. O “nada completo” é logicamente inconsistente com a existência real, portanto, há uma inferência perfeitamente válida da noção de nada para o não-ser (non-esse). O nada não pode existir. Se a natureza do nada implica em sua inexistência, a natureza de seu oposto, o ser completamente puro, implica em sua existência real. Fazer uso das categorias de sua própria metafísica dessa maneira mostra, de forma mais eficaz do que simplesmente apoiar a mente em uma contradição, por que a inferência ontológica é válida.

A base do argumento até agora é uma noção, não de Deus, mas de uma essência, completamente pura, de não-ser. Alguém pode se perguntar onde Boaventura adquire essa noção, aparentemente tirada do nada. A resposta dele é que a análise conceitual da primeira de todas as noções, o ser transcendental (ens), revela essa noção puramente metafísica.

Ora, como o não-ser é a privação do ser, ele não surge na mente a não ser por meio do ser; ao passo que o ser não surge na mente por meio de outra coisa. Com efeito, tudo o que é pensado ou é pensado como não-ser, ou como um ser em potência, ou como um ser em ato. Portanto, se um não-ser é inteligível apenas por meio de um ser, e um ser em potência é inteligível apenas por meio de um ser em ato, e o ser denomina a pura atualidade de um ser, segue-se que o ser é aquilo que primeiro surge no intelecto, e que esse ser é aquilo que é pura atualidade. (Itinerário 5.3 [Quaracchi V: 308]; trans. autores)

Aqui Boaventura investiga a noção de “um ser” (ens) e descobre que ela tem dois princípios componentes: existência independente (existere), que dá ao ser o potencial de ter uma certa essência; e ser (esse), a atualidade de tal essência. É esse, e não existere, que “denomina a pura atualidade de um ser”. Aqui, “atualidade” (actus) significa “aquilo que torna o ser atualmente inteligível, dando-lhe a essência atual que ele tem”. Esse movimento de análise conceitual abre a mente para ver que podemos entender uma criatura como “um ser” (ens) somente ao nos referirmos à noção de um ato de ser que é puro em relação ao não-ser (esse purum), na verdade, que é puro em relação a qualquer não-ser (esse purissimum). Implícita na própria noção de “ser” transcendental e um pressuposto de nossa compreensão da noção de ser transcendental, está a noção de ser sem nenhum indício de não-ser (esse purissimum). Mesmo que apenas implícita, essa noção deve estar presente na mente de qualquer pessoa que compreenda o ser (ens), ou seja, de qualquer pessoa que compreenda qualquer coisa.

Uma vez demonstrado que o esse purissimum é uma noção que implica existência real e que todos nós possuímos essa noção como um componente da noção fundamental de um ser (ens), resta apenas identificar o esse purissimum com Deus.

Contudo, não se trata de um ser particular, que é um ser limitado porque misturado com a potência, nem de um ser análogo, porque este tem a menor atualidade, uma vez que é em seu menor grau. Portanto, o resultado é que esse ser é o ser divino. (Itinerário 5.3 [Quaracchi V: 308-309]; trans. autores)

Se o esse purissimum realmente existe, como foi provado, ele deve existir em um dos três modos. Todavia, como o ser particular e intencional não pode ser completamente perfeito, o esse purissimum deve ser idêntico ao ser divino.

O ponto de partida real, mas inicialmente oculto, para o argumento ontológico de Boaventura no Itinerário é a noção de esse purissimum, considerada não subjetivamente como existente enquanto um conceito em uma mente humana, mas em seu significado objetivo7, isto é, como significando um certo tipo de quiddidade ou essência. A realização do argumento ontológico, na visão de Boaventura, é dupla: mostra que essa essência deve realmente existir e mostra que essa essência não é outra senão Deus.

Boaventura localiza o conhecimento da existência de Deus em todas as três partes de uma ciência aristotélica — como conclusão demonstrada, como axioma comum e como postulado apropriado. Ele pode ser provado por meio de dois tipos de demonstrações do fato, por um argumento de iluminação que começa dentro da mente e um argumento aitiológico que começa fora. Essas provas procedem da verdade criada enquanto vestígio para o Deus único como sua causa. Mas “Deus existe” também é um princípio reconhecido por praticamente todos os seres humanos, um tipo de axioma que se baseia em criaturas concebidas como sombras da única divindade, para as quais os argumentos explícitos que especificam a causalidade de Deus não são mais necessários do que para outros axiomas. Por fim, há duas maneiras pelas quais a existência de Deus é conhecida como um postulado: primeiro, por meio do argumento ontológico, em que os atributos transcendentais encontrados nas criaturas funcionam como vestígios que fornecem à mente as noções que ela usa no argumento para a existência do Deus único; e segundo, como um artigo de fé. Aqui a fé é postulada com base na autoridade da revelação e é certa, mas sua certeza vem de Deus, não da razão humana. E aqui, também, as características das criaturas intelectuais, especialmente os seres humanos, funcionam como imagens e semelhanças do Deus Trinitário. O conhecimento da existência de Deus, em suma, é onipresente. Assim falou o seguidor de Francisco.

Notas:

  1. Boaventura escreveu duas obras de hagiografia sobre Francisco de Assis: A Legenda Maior, um texto destinado a ser lido em voz alta nas casas franciscanas, e a Legenda Menor, um texto litúrgico destinado a ser lido durante a celebração de oito dias da festa de Francisco na Ordem dos Frades Menores. A edição crítica da Legenda Maior e da Legenda Menor está na Analecta Franciscana, volume X. Muitas vezes os estudiosos citam uma reimpressão dessa edição sem todas as notas e aparatos da coleção Fontes Franciscani, eds. Enrico Menestò e Stefano Brufani (Assis: Edizioni Porziuncola, 1995). A tradução de todos os textos de Boaventura sobre São Francisco pode ser encontrada na coleção Francis of Assisi Early Documents (FA:ED), volume 2. ↩︎
  2. Para a cronologia de Boaventura, veja Bougerol (1961), estudo anterior a Distelbrink (1975). ↩︎
  3. Joseph Ratzinger (mais tarde Bento XVI após sua eleição para o papado) escreveu sua habilitationsschrift sobre a teologia da revelação em São Boaventura, da qual apenas uma pequena parte foi aceita na época – especificamente, a parte sobre a teologia da história em São Boaventura. Essa parte foi publicada e, por fim, traduzida para o inglês. Em 2009, Bento XVI recebeu o texto completo publicado de todo o seu habilitationsschrift, que agora está disponível como parte do Gesammelte Schriften de Ratzinger. Esse texto completo ainda não foi traduzido para o inglês. ↩︎
  4. “Raramente, ou nunca, a relação entre a doutrina filosófica do ser e o dogma trinitário da fé foi trabalhada com um cuidado tão elaborado” (Hayes 1979: 27, “Introduction“). ↩︎
  5. O termo “matéria física” está sendo empregado em vez de simplesmente “matéria” porque a matéria em sua essência é, na verdade, mais ampla do que a matéria física. Na medida em que a matéria denota um princípio de potencialidade, a matéria é encontrada até mesmo em entidades não físicas, como anjos e almas humanas. Consulte a seção IV, criaturas racionais. ↩︎
  6. Os transcendentais disjuntivos são: posterior e anterior; de outro e não de outro; possível e necessário; relativo e absoluto; qualificado e absoluto; de outro e de si mesmo; por participação e essencialmente; potencial e atual; composto e simples; e mutável e imutável. ↩︎
  7. 29. Cf. J. Seifert 1992: 218, para quem o argumento tem seu “ponto de partida na essência objetiva e não em um mero conceito de Deus”. ↩︎

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Bibliography

A. Primary Sources

A.1 Bonaventure works

The following works by Bonaventure are mentioned in this entry.

  • Commentaria in Quattuor Libros Sententiarum (Commentary on the Sentences), Quaracchi I–IV.
    • [In I Sent.In Primum Librum Sententiarum, Quaracchi I.
    • [In II Sent.In Secundum Librum Sententiarum, Quaracchi II.
  • Quaestiones disputatae (Disputed Questions)
    • De scientia Christi (On the knowledge of Christ), Quaracchi V: 3–43. Translation in Hayes 1992.
    • De mysterio Trinitatis (On the mystery of the Trinity), Quaracchi V: 45–115. Translated in Hayes 1979.
    • De perfectione evangelica (On Evangelical Perfection), Quaracchi V: 117–198. Translated in Karris & Reist 2008.
  • [Letter to an Unknown MasterEpistola de tribus quaestionibus, Quaracchi VIII: 331–336. Another Latin edition is Delorem 1951. English translation, Monti 1994: 39–56.
  • Life of St. Francis, translated in FA:ED: Volume 2, 522–650.
  • Legenda maior, in Legendae, 555–652. Translated in FA:ED: Volume 2, 522–650.
  • Legenda minor, in Legendae, 653–678. Translated in FA:ED: Volume 2, 684–717.
  • [JourneyItinerarium mentis in Deum (Journey of the Mind to God), Quaracchi V: 293–316. Translated Armstrong 2020, Cousins 1978.
  • [Collationes in Hexaëmeron], Quaracchi V: 327–454. Translated in Hammond 2018.
  • [Commentary on JohnCommentarius in Evangelium Ioannis, Quaracchi VI: 237–532. Translated in Karris 2007.
  • [Commentary on EcclesiastesCommentarius in Ecclesiastae, Quaracchi VI: 1–104. Translated in Karris & Murray 2005.
  • [Commentary on LukeCommentarius in Evangellium S. Lucae, Quaracchi VII: 1–604. Translated in Karris 2001–2004.
  • On Retracing the Arts to Theology (Opusculum de reductione artium ad theologiam), Quaracchi V: 317–326.
  • Breviloquium, Quaracchi V: 199–292.
  • A Soliloquy about Four Mental Exercises (Soliloquium de quatuor mentalibus exercitiis), Quaracchi VIII: 28–67. Translated in Coughlin 2006: 211–344.
  • The Tree of Life (Lignum vitae), Quaracchi VIII: 68–87. Translated in Cousins 1978.
  • The Triple Way (De triplici via), Quaracchi VIII: 3–27. Translated in Coughlin 2006: 81–133.
  • Collations on the Ten Commandments (Collationes de decem praeceptis), Quaracchi V: 505–531. Translated in Spaeth 1995.
  • Collations on the Seven Gifts of the Holy Spirit (Collationes de septem donis Spiritus sancti), Quaracchi V: 455–504. Translated in Hayes & Karris 2008.
  • Apologia pauperum (Defense of the Mendicants), Quaracchi VIII: 233–330.

A.2 Original Texts of Bonaventure

  • Bougerol, Jacques Guy (ed.), 1977, Sermones Dominicales, Bibliotheca Franciscana Scholastica Medii Aevi, 27, Grottaferrata: Collegio S. Bonaventurae.
  • Bougerol, Jacques Guy (ed.), 1990, Sermons De Tempore. Reportations du manuscript Milan, Abrosienne A 11 sup., Paris: Éditions Franciscaines.
  • Bougerol, Jacques Guy (ed.), 1993, Sermons De Diversis, 2 vols., Paris: Editions Franciscaines.
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  • Salimbene de Adam, Cronica. Editions:
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  • White, John R., 2011, “St. Bonaventure and the Problem of Doctrinal Development”, American Catholic Philosophical Quarterly, 85(1): 177–202. doi:10.5840/acpq201185110

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Other Internet Resources

  • St. Bonaventure, Catholic Information Network
  • St. Bonaventure, The Franciscan Archive
  • St. Bonaventure, Jacques Maritain Center, University of Notre Dame
  • Bonaventura, Saint, entry in 1911 Encyclopedia Britannica (11th edition).
  • St. Bonaventure New Advent Catholic Encyclopedia

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Sobre o Autor ou Tradutor

Bernardo Santos

Aluno do Olavão, bacharel em matemática, amante da Filosofia, tradutor e músico nas horas vagas, Bernardo Santos é administrador principal do Diário Intelectual.

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